domingo, 26 de novembro de 2017

Os desafios da formação de professores
Por Mozart Neves Ramos - Todos Pela Educação em 01/06/2013
Um dos maiores desafios da Educação brasileira — no curto, médio e longo prazos — está, sem dúvida, relacionado à formação de professores e, em especial, à valorização da carreira do magistério.
Hoje, apenas 2% dos jovens querem seguir a carreira docente, e sobram razões para isso: salários injustos, ausência de planos de carreira, o descaso ou a pouca prioridade dada aos cursos de licenciatura pelas universidades — normalmente, tratadas como os “primos pobres” dos bacharelados — e as difíceis condições de trabalho nas escolas e, muitas vezes, no entorno delas. Assim, não surpreende o desinteresse dos jovens brasileiros em seguir essa carreira tão importante para qualquer país que deseja ter um futuro sólido e saudável.


É ilustrativo olhar separadamente cada um desses aspectos que desmotivam os jovens a serem docentes.
A primeira razão é a baixa remuneração, sob quaisquer critérios de comparação. Podemos pensar no mais direto, que não leva especificamente em consideração a importância social do professor, mas tão-somente o equipara com outras profissões que requerem a mesma escolaridade. Pois bem: um professor no Brasil ganha 40% a menos do que a média de outros profissionais para os quais se exigem o mesmo nível de formação. De acordo com os dados da Pnad/ IBGE (2009), um professor ganha, em média, R$ 1.800,00, enquanto outros profissionais com a mesma escolaridade ganham R$ 2.800,00. Faltam também bons planos de carreira. Um olhar mais atento logo perceberá que boa parte das redes de ensino no Brasil não tem um plano atrativo para essa juventude, que a desafie a avançar e a crescer. Mais do que isso: é preciso lembrar que as condições de trabalho — que compõem a cesta de atributos de uma escolha profissional — também são muito desestimulantes. Lamentavelmente, a violência vem crescendo nas escolas e também contribui para afastar os jovens do magistério.
Como consequência, estima-se que o déficit de professores na Educação Básica seja de 250 mil. Em algumas áreas, como química, física e matemática, estamos vivendo (e não é de agora) um “apagão” de mão de obra qualificada. E o pior: a formação inicial, dada pelas nossas universidades, deixa muito a desejar, em relação às necessidades atuais da escola pública, conforme revelou pesquisa de Bernardete Gatti, da Fundação Carlos Chagas.
Esse estudo mostrou que tanto a formação inicial como a continuada dos nossos professores não dialogam com a escola pública. A formação é muito teórica. Por exemplo, os estágios obrigatórios são registrados de modo vago, sem projeto ou plano de estágio, nem sinalizações sobre o campo de prática ou a atividade de supervisão. Vê-se que a Licenciatura não tem identidade, é um híbrido mal estruturado entre o bacharelado e algumas disciplinas do campo pedagógico. Entre outros resultados, verifica-se que a evasão chega a 50%.
A verdade é que as licenciaturas recebem pouca atenção por parte das nossas universidades. A contribuição que a universidade brasileira vem dando ao desenvolvimento científico e tecnológico de nosso País, tanto na formação de recursos humanos (a título de exemplo, na pós-graduação o Brasil forma hoje 12 mil doutores) como na produção de novos conhecimentos, é incontestável e nos coloca na 13ª posição do ranking mundial da produção científica. Mas, para chegar a esse patamar, foi preciso um grande esforço da comunidade científica aliado a políticas públicas arrojadas e exitosas. Essa estratégia, em si correta, fez com que a universidade se distanciasse da escola pública.
O problema é que esse distanciamento produziu uma falta de vocação da universidade para formar professores para a atual realidade da escola. Além disso, o tempo da maioria dos professores de nossas universidades está comprometido com as atividades de ensino na graduação e na pós-graduação e com a pesquisa, sem falar naquele dedicado à burocracia.
O Ministério da Educação, diga-se de passagem, vem procurando reverter este quadro. Um exemplo desse esforço veio com a implantação do programa Reuni para as universidades federais, com foco na formação de professores. Nessa mesma linha, implantou a Universidade Aberta do Brasil e a Plataforma Freire vinculada à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
É preciso, enfim, recuperar a atratividade do magistério. Países como Coreia do Sul, Finlândia, Cingapura, Canadá e Japão têm uma coisa em comum: ser professor nesses países é objeto de desejo. Por quê? Essencialmente por quatro razões: salário inicial atraente, plano de carreira motivador, pautado no desempenho em sala de aula e na formação continuada, formação inicial sólida com foco na prática docente e escolas bem estruturadas e organizadas. Não há saída estrutural para o problema da formação de professores no Brasil sem o enfrentamento desses fatores.
Temos já experiências no Brasil que podem ser paradigmáticas nesse sentido, como a que começa a ser implementada pelo MEC, o governo do Estado do Pernambuco e a Universidade Federal do Pernambuco, programa que pretende ser uma mudança de paradigma e pode ser resumido nos seguintes eixos: formação interdisciplinar, uso intenso de novas tecnologias (incluindo laboratórios de produção e uso de games com fins educativos), ampliação da articulação entre disciplinas específicas e pedagógicas, ou seja, entre teoria e prática; exploração de diferentes espaços de aprendizagem, como laboratórios e museus de ciência; introdução da residência docente, no lugar dos atuais estágios; foco na prática docente em escolas de tempo integral, nos períodos de contraturno; acompanhamento desde o Ensino Médio, com um programa de bolsas de iniciação à docência.
São muitos os caminhos. Mas é preciso ajustar os currículos da Pedagogia e das licenciaturas para um novo tempo. O Brasil tem ainda uma escola do século 19, um professor do século 20, mas um aluno do século 21. Assim, ao currículo atual deveria ser dado um novo foco — a sala de aula.


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