PROGRESSÃO
CONTINUADA E PROMOÇÃO AUTOMÁTICA
Izabel Sadalla
Grispino *
O sistema de “regime de progressão continuada” consiste na ampliação do
ciclo básico que, desde 1984, era formado só de 1.ª e 2.ª séries. Passou em
1998, no Estado de São Paulo, para dois grandes ciclos no ensino fundamental: o
de 1.ª à 4.ª série e o de 5.ª à 8.ª série.
O termo progressão continuada, num sentido amplo, aplica-se a toda
educação, pois o ensino-aprendizagem precisa estar inserido numa progressão
continuada de estudo. Sob o prisma da legislação, refere-se à formação de
ciclos, num processo de conscientização de que o aluno não pode estacionar, tem
que progredir continuadamente dentro de sua fase de desenvolvimento, de seu
nível de conhecimento, de seu ritmo de aprendizagem, num processo de promoção
automática, ou seja, a reprovação é substituída pela progressão continuada, em
que os alunos são avaliados passo a passo, reportando-se a recuperações
paralelas, reforço de estudos e, se necessário, à recuperação final, no período
de férias.
A Secretaria Estadual da Educação, interpretando o artigo 24, em seu
inciso II, alíneas a, b e c, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), que criou a “reclassificação e a classificação”, resolveu dar chance de
aprovação, tanto para alunos que obtiveram notas baixas o ano todo, quanto para
os que não atingiram 75% de presença.
O inciso II diz: “A classificação em qualquer série ou etapa, exceto a
primeira do ensino fundamental, pode ser feita:
1. por promoção, para
alunos que cursaram, com aproveitamento, a série ou fase anterior, na própria
escola;
1. por transferência,
para candidatos procedentes de outra escola;
2. Independentemente
de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que defina o
grau de desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua inscrição na
série ou etapa adequada, conforme regulamentação do respectivo sistema de
ensino”.
A reclassificação permite à escola avaliar e determinar a série de
alunos oriundos de outras instituições e, mesmo, de outros países, sem levar em
conta documentos escolares. A classificação permite a promoção avaliando
conhecimentos, sem considerar a série cursada.
É uma visão avançada em educação, essencialmente democrática, mas é
preciso cuidadoso critério, senso de propriedade para não resvalar no comum.
Uma coisa é avaliar, ocasionalmente, um candidato que, por circunstâncias
especiais de estudo, de trabalho ou de doença, se afastou da escola e com base
no conhecimento apresentado, determinar-lhe a série; outra coisa é adotar
critérios facilitadores de promoção a alunos que podem freqüentar regularmente
uma classe e por displicência ou irresponsabilidade não cumprem o que cumprem
os demais colegas. Achamos, sim, que o professor deva ser orientado no sentido
de dar ao aluno as chances de recuperação, de acordo com o programado. Dar-lhe
oportunidades diversas à sua aprendizagem, mas fazê-lo com limite e
comedimento, reforçando, no caso, o aspecto formativo da conduta responsável.
Estamos na era do conhecimento, dele não podemos nos furtar. Como fica a
formação do aluno nessa velocidade de aprovação? Que conseqüências
histórico-culturais teremos dessa filosofia de aprovação? Será possível criar
um trabalhador rápido, eficiente, adaptado à vida competitiva do mercado,
através dessa filosofia?
PROMOÇÃO AUTOMÁTICA E QUALIDADE DE
ENSINO – Hubert Alqueres, referendando a Secretaria da Educação de São Paulo,
considera que “a performance do sistema pode ser aferida pelas taxas de
reprovação e de evasão”, concluindo que as taxas estão caindo. Considera que as
mudanças do sistema de aprovação, que as classes de recuperação, a
reorganização do ensino – pela qual as escolas foram desmembradas, ficando as
1.ªs até as 4.ªs séries num estabelecimento, e as 5.ªs até as 8.ªs séries em
outro – e a melhoria da infra-estrutura, criaram condições para que o aluno
permanecesse na escola, não se evadisse.
Acreditamos na força dessas medidas, porém, não de maneira absoluta.
Ademais, a diminuição da repetência não pode estar vinculada, simplesmente, ao
processo de promoção automática, mesmo estando calcado em cuidadoso esquema de
observação pedagógica contínua, ao longo do ano. Esta deve ser um primeiro estágio,
uma medida paliativa, para que o aluno se recupere e adquira os conhecimentos
mínimos necessários ao seu progresso.
Mas após um determinado tempo, a médio prazo, a escola precisa alcançar
o objetivo de elevar o padrão de conhecimento, com vistas a um ensino de
qualidade, a um ensino que garanta a aprendizagem num nível mais elevado.
Os alunos, realmente, precisam assimilar conhecimentos, ser trabalhados
em suas capacidades mentais, precisam avançar, aprender e, ao chegar no final
de um ciclo, devem estar embasados do conteúdo correspondente a este ciclo, não
importando qual o processo utilizado, se recuperação, se promoção automática ou
se, necessário, a repetência. É preciso que os próprios alunos estejam
conscientes de que a qualidade de ensino é uma necessidade e que sem ela pouca
ou nenhuma opção terão de se realizar.
Se a época exige qualificação, aumentar anos de escolaridade do povo
brasileiro, na base de uma aprovação facilitada, é continuar desqualificando-o
para a competição profissional. Costumam-se citar países de primeiro mundo,
como dos Estados Unidos, da Europa, como Inglaterra, Alemanha e França, ou do
Japão, onde não há reprovação nos primeiros oito anos de escolaridade, com sua
formação de ciclos. Não se pode, entretanto, comparar a infra-estrutura
educacional desses países, com sua cultura tradicional densa, com a do Brasil.
A TEORIA E A PRÁTICA EDUCATIVA
– As normas adotadas oficialmente, os passos propostos pela reforma do
ensino, devem passar pelo crivo do bom senso, da consciência que a prática
educativa confere ao professor. É ele, o professor, o elemento abalizador da
problemática educacional. Somente o professor é capaz de assinalar os eventuais
descompassos entre o discurso e a realidade, entre as ações implementadas e
suas reais condições de trabalho.
Se não aprimorarmos a formação do professor, se não melhorarmos suas
condições de trabalho – classes superlotadas de 40 a 50 alunos – se
não melhorarmos a qualidade de vida do professor, não nos iludamos, não sejamos
mais realistas que o rei, vamos continuar trabalhando a favor das estatísticas
e contra o próprio aluno, contra a própria sociedade tecnológica.
* Supervisora de ensino
aposentada.
(Publicado em setembro/2000)
(Publicado em setembro/2000)
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