O que é indústria cultural
INTRODUÇÃO
Indústria cultural é o nome dado a
empresas e instituições que trabalham com a produção de projetos, canais,
jornais, rádios, revistas e outras formas de descontração, baseadas na cultura,
visando o lucro. Sua origem se deu através da sociedade capitalista que
transformou a cultura num produto comercializado.
A principal forma cultural construída
por estas indústrias é a televisão que ensina e forma indivíduos cada vez mais
cedo. Nela podem-se observar diferentes temas e culturas expostas a qualquer
horário e idade. Os conteúdos nela existentes possuem mensagens subliminares
que conseguem escapar da consciência, o que tende a provocar alienação.
Diante disso pode-se perceber este meio
cultural como um produto bom que é capaz de mostrar conteúdos reveladores e
contribuir para o desenvolvimento humano e um produto ruim capaz de alienar uma
pessoa levando-a a pensar e agir como lhe é proposto sem qualquer tipo de
argumentação.
A produção realizada pela indústria
cultural é centralizada no interesse lucrativo, o que impõe um determinado
padrão a ser mostrado que transforma o espectador numa pessoa de crítica
rebaixada e de mente narcotizada.
INDÚSTRIA
CULTURAL E CULTURA DE MASSA
A modernidade terminou um processo que a
Filosofia começara desde a Grécia: o desencantamento do mundo, isto é, a
passagem do mito à razão, da magia à ciência e à lógica. Esse processo liberou
as artes da função e finalidade religiosas, dando-lhes autonomia.
No entanto, a partir da segunda revolução
industrial no século XIX e prosseguindo no que se denomina agora sociedade
pós-industrial ou pós-moderna (iniciada nos anos 70 do século passado), as
artes foram submetidas a uma nova servidão: as regras do mercado capitalista e
a ideologia da indústria cultural, baseada na idéia e na prática do consumo de
“produtos culturais” fabricados em série. As obras de arte são mercadorias,
como tudo o que existe no capitalismo.
Perdida a aura, a arte não se
democratizou, massificou-se para consumo rápido no mercado da moda e nos meios
de comunicação de massa, transformando-se em propaganda e publicidade, sinal de
status social, prestígio político e controle cultural.
Sob os efeitos da massificação da
indústria e consumo culturais, as artes correm o risco de perder três de suas
principais características:
1.
de expressivas, tornarem-se reprodutivas e repetitivas;
2.
de trabalho da criação, tornarem-se eventos para consumo;
3.
de experimentação do novo, tornarem-se consagração do consagrado pela moda e
pelo consumo.
A arte possui intrinsecamente valor de
exposição ou exponibilidade, isto é, existe para ser contemplada e fruída. É
essencialmente espetáculo, palavra que vem do latim e significa: dado à
visibilidade. No entanto, sob o controle econômico e ideológico das empresas de
produção artística, a arte se transformou em seu oposto: é um evento para
tornar invisível a realidade e o próprio trabalho criador das obras. É algo
para ser consumido e não para ser conhecido, fruído e superado por novas obras.
As obras de arte e de pensamento
poderiam democratizar-se com os novos meios de comunicação, pois todos
poderiam, em princípio, ter acesso a elas, conhecê-las, incorporá-las em suas
vidas, criticá-las, e os artistas e pensadores poderiam superá-las em outras,
novas.
A democratização da cultura tem como
precondição a idéia de que os bens culturais (no sentido restrito de obras de
arte e de pensamento e não no sentido antropológico amplo, que apresentamos no
estudo sobre a idéia de Cultura) são direito de todos e não privilégio de
alguns. Democracia cultural significa direito de acesso e de fruição das obras
culturais, direito à informação e à formação culturais, direito à produção
cultural.
Ora, a indústria cultural acarreta o
resultado oposto, ao massificar a Cultura. Por quê? Em primeiro lugar, porque
separa os bens culturais pelo seu suposto valor de mercado: há obras “caras” e
“raras”, destinadas aos privilegiados que podem pagar por elas, formando uma
elite cultural; e há obras “baratas” e “comuns”, destinadas à massa. Assim, em
vez de garantir o mesmo direito de todos à totalidade da produção cultural, a
indústria cultural introduz a divisão social entre elite “culta” e massa
“inculta”. O que é a massa? É um agregado sem forma, sem rosto, sem identidade
e sem pleno direito à Cultura.
Em segundo lugar, porque cria a ilusão
de que todos têm acesso aos mesmos bens culturais, cada um escolhendo
livremente o que deseja, como o consumidor num supermercado. No entanto, basta
darmos atenção aos horários dos programas de rádio e televisão ou ao que é
vendido nas bancas de jornais e revistas para vermos que, através dos preços,
as empresas de divulgação cultural já selecionaram de antemão o que cada grupo
social pode e deve ouvir, ver ou ler.
No caso dos jornais e revistas, por
exemplo, a qualidade do papel, a qualidade gráfica de letras e imagens, o tipo
de manchete e de matéria publicada definem o consumidor e determinam o conteúdo
daquilo a que terá acesso e tipo de informação que poderá receber. Se
compararmos, numa manhã, cinco ou seis jornais, perceberemos que o mesmo mundo
– este no qual todos vivemos – transforma-se em cinco ou seis mundos diferentes
ou mesmo opostos, pois um mesmo acontecimento recebe cinco ou seis tratamentos
diversos, em função do leitor que a empresa jornalística pretende atingir.
Em terceiro lugar, porque inventa uma
figura chamada “espectador médio”, “ouvinte médio” e “leitor médio”, aos quais
são atribuídas certas capacidades mentais “médias”, certos conhecimentos
“médios” e certos gostos “médios”, oferecendo-lhes produtos culturais “médios”.
Que significa isso?
A indústria cultural vende Cultura. Para
vendê-la, deve seduzir e agradar o consumidor. Para seduzi-lo e agradá-lo, não
pode chocá-lo, provocá-lo, fazê-lo pensar, fazê-lo ter informações novas que o
perturbem, mas deve devolver-lhe, com nova aparência, o que ele já sabe, já
viu, já fez. A “média” é o senso comum cristalizado que a indústria cultural
devolve com cara de coisa nova.
Em quarto lugar, porque define a Cultura
como lazer e entretenimento, diversão e distração, de modo que tudo o que nas
obras de arte e de pensamento significa trabalho da sensibilidade, da
imaginação, da inteligência, da reflexão e da crítica não tem interesse, não
“vende”. Massificar é, assim, banalizar a expressão artística e intelectual. Em
lugar de difundir e divulgar a Cultura, despertando interesse por ela, a
indústria cultural realiza a vulgarização das artes e dos conhecimentos.
OS MEIOS DE
COMUNICAÇÃO
Dos meios de comunicação, sem dúvida, o
rádio e a televisão manifestam mais do que todos os outros esses traços da
indústria cultural.
Começam introduzindo duas divisões: a
dos públicos (as chamadas “classes” A, B, C e D) e a dos horários (a
programação se organiza em horários específicos que combinam a “classe”, a
ocupação – donas-de-casa, trabalhadores manuais, profissionais liberais,
executivos -, a idade – crianças, adolescentes, adultos – e o sexo).
Essa divisão é feita para atender às
exigências dos patrocinadores, que financiam os programas em vista dos consumidores
potenciais de seus produtos e, portanto, criam a especificação do conteúdo e do
horário de cada programa. Em outras palavras, o conteúdo, a forma e o horário
do programa já trazem em seu próprio interior a marca do patrocinador.
Muitas vezes, o patrocinador financia um
programa que nada tem a ver, diretamente, com o conteúdo e a forma veiculados.
Ele o faz porque, nesse caso, não está vendendo um produto, mas a imagem de sua
empresa. É assim, por exemplo, que uma empresa de cosméticos pode, em lugar de
patrocinar um programa feminino, patrocinar concertos de música clássica; uma
revendedora de motocicletas, em lugar de patrocinar um programa para
adolescentes, pode patrocinar um programa sobre ecologia.
A figura do patrocinador determina o
conteúdo e a forma de outros programas, ainda que não patrocinados por ele. Por
exemplo, um banco de um governo estadual pode patrocinar um programa de
auditório, pois isto é conveniente para atrair clientes, mas pode,
indiretamente, influenciar o conteúdo veiculado pelos noticiários. Por quê?
Porque a quantidade de dinheiro paga
pelo banco à rádio ou à televisão para o programa de auditório é muito elevada
e interessa aos proprietários daquela rádio ou televisão. Se o noticiário
apresentar notícias desfavoráveis ao governo do Estado ao qual pertence o
banco, este pode suspender o patrocínio do programa de auditório. Para não
perder o cliente, a emissora de rádio ou de televisão não veicula notícias
desfavoráveis àquele governo e, pior, veicula apenas as que lhe são favoráveis.
Dessa maneira, o direito à informação desaparece e os ouvintes ou
telespectadores são desinformados ou ficam mal informados.
A desinformação, aliás, é o principal
resultado da maioria dos noticiários de rádio e televisão. Com efeito, como são
apresentadas as notícias? De modo geral, são apresentadas de maneira a impedir
que o ouvinte e o espectador possam localizá-la no espaço e no tempo.
Falta de localização espacial: o espaço
real é o aparelho de rádio e a tela da televisão, que tem a peculiaridade de
retirar as diferenças e distâncias geográficas, de tal modo que algo acontecido
na China, na Índia, nos Estados Unidos ou em Campina Grande pareça igualmente
próximo e igualmente distante.
Falta de localização temporal: os
acontecimentos são relatados como se não tivessem causas passadas nem efeitos
futuros; surgem como pontos puramente atuais ou presentes, sem continuidade no
tempo, sem origem e sem conseqüências; existem enquanto forem objetos de
transmissão e deixam de existir se não forem transmitidos.
Paradoxalmente, rádio e televisão podem
oferecer-nos o mundo inteiro num instante, mas o fazem de tal maneira que o
mundo real desaparece, restando apenas retalhos fragmentados de uma realidade
desprovida de raiz no espaço e no tempo. Nada sabemos, depois de termos tido a
ilusão de que fomos informados sobre tudo.
Também é interessante a inversão entre
realidade e ficção produzida pela mídia. Acabamos de mencionar o modo como o
noticiário nos apresenta um mundo irreal, sem História, sem causas nem
conseqüências, descontínuo e fragmentado. Em contrapartida, as novelas criam o
sentimento de realidade. Elas o fazem usando três procedimentos principais:
1.
o tempo dos acontecimentos novelísticos é lento para dar a ilusão de que, a
cada capítulo, passou-se apenas um dia de nossa vida, ou passaram-se algumas
horas, tais como realmente passariam se fôssemos nós a viver os acontecimentos
narrados;
2.
os personagens, seus hábitos, sua linguagem, suas casas, suas roupas, seus
objetos são apresentados com o máximo de realismo possível, de modo a impedir
que tenhamos distância diante deles (ao contrário do cinema e do teatro, que
suscitam em nós o sentimento de proximidade justamente porque nos fazem
experimentar o da distância);
3.
como conseqüência, a novela nos aparece como relato do real, enquanto o
noticiário nos aparece como irreal. Basta ver, por exemplo, a reação de cidades
inteiras quando uma personagem da novela morre (as pessoas choram, querem ir ao
enterro, ficam de luto) e a falta de reação das pessoas diante de chacinas
reais, apresentadas nos noticiários.
Vale a pena, também, mencionar dois
outros efeitos que a mídia produz em nossas mentes: a dispersão da atenção e a
infantilização.
Para atender aos interesses econômicos
dos patrocinadores, a mídia divide a programação em blocos que duram de sete a
dez minutos, cada bloco sendo interrompido pelos comerciais. Essa divisão do
tempo nos leva a concentrar a atenção durante os sete ou dez minutos de
programa e a desconcentrá-la durante as pausas para a publicidade.
Pouco a pouco, isso se torna um hábito.
Artistas de teatro afirmam que, durante um espetáculo, sentem o público ficar
desatento a cada sete minutos. Professores observam que seus alunos perdem a
atenção a cada dez minutos e só voltam a se concentrar após uma pausa que dão a
si mesmos, como se dividissem a aula em “programa” e “comercial”.
Ora, um dos resultados dessa mudança
mental transparece quando criança e jovem tentam ler um livro: não conseguem
ler mais do que sete a dez minutos de cada vez, não conseguem suportar a
ausência de imagens e ilustrações no texto, não suportam a idéia de precisar
ler “um livro inteiro”. A atenção e a concentração, a capacidade de abstração
intelectual e de exercício do pensamento foram destruídas. Como esperar que
possam desejar e interessar-se pelas obras de arte e de pensamento?
Por ser um ramo da indústria cultural e,
portanto, por ser fundamentalmente uma vendedora de Cultura que precisa agradar
o consumidor, a mídia infantiliza. Como isso acontece? Uma pessoa (criança ou
não) é infantil quando não consegue suportar a distância temporal entre seu
desejo e a satisfação dele. A criança é infantil justamente porque para ela o
intervalo entre o desejo e a satisfação é intolerável (por isso a criança
pequenina chora tanto).
Ora,
o que faz a mídia? Promete e oferece gratificação instantânea. Como o consegue?
Criando em nós os desejos e oferecendo produtos (publicidade e programação)
para satisfazê-los. O ouvinte que gira o dial do aparelho de rádio
continuamente e o telespectador que muda continuamente de canal o fazem porque
sabem que, em algum lugar, seu desejo será imediatamente satisfeito.
Além disso, como a programação se dirige
ao que já sabemos e já gostamos, e como toma a cultura sob a forma de lazer e
entretenimento, a mídia satisfaz imediatamente nossos desejos porque não exige
de nós atenção, pensamento, reflexão, crítica, perturbação de nossa
sensibilidade e de nossa fantasia. Em suma, não nos pede o que as obras de arte
e de pensamento nos pedem: trabalho sensorial e mental para compreendê-las,
amá-las, criticá-las, superá-las. A Cultura nos satisfaz, se tivermos paciência
para compreendê-la e decifrá-la. Exige maturidade. A mídia nos satisfaz porque
nada nos pede, senão que permaneçamos sempre infantis.
Um último traço da indústria cultural
que merece nossa atenção é seu autoritarismo, sob a aparência de democracia. Um
dos melhores exemplos encontra-se nos programas de aconselhamento. Um
especialista – é sempre um especialista – nos ensina a viver, um outro nos
ensina a criar os filhos, outro nos ensina a fazer sexo, e assim vão se
sucedendo especialistas que nos ensinam a ter um corpo juvenil e saudável, boas
maneiras, jardinagem, meditação espiritual, enfim, não há um único aspecto de
nossa existência que deixe de ser ensinado por um especialista competente.
Em princípio, seria absurdo e injusto
considerar tais ensinamentos como autoritários. Pelo contrário, deveríamos
considerá-los uma forma de democratizar e sociabilizar conhecimentos. Onde se
encontra o lado autoritário desse tipo de programação (no rádio e na televisão)
e de publicação (no caso de jornais, revistas e livros)? No fato de que
funcionam como intimidação social.
De fato, como a mídia nos infantiliza,
diminui nossa atenção e capacidade de pensamento, inverte realidade e ficção e
promete, por meio da publicidade, colocar a felicidade imediatamente ao alcance
de nossas mãos, transforma-nos num público dócil e passivo. Uma vez que nos
tornamos dóceis e passivos, os programas de aconselhamento, longe de divulgar
informações (como parece ser a intenção generosa dos especialistas) torna-se um
processo de inculcação de valores, hábitos, comportamentos e idéias, pois não
estamos preparados para pensar, avaliar e julgar o que vemos, ouvimos e lemos. Por
isso, ficamos intimidados, isto é, passamos a considerar que nada sabemos, que
somos incompetentes para viver e agir se não seguirmos a autoridade competente
do especialista.
Dessa maneira, um conjunto de programas
e publicações que poderiam ter verdadeiro significado cultural tornam-se o
contrário da Cultura e de sua democratização, pois se dirigem a um público
transformado em massa inculta, desinformada e passiva.
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