sábado, 25 de fevereiro de 2017

A CONCEPÇÃO DE CRIANÇA NA ÓTICA DOS EDUCADORES

RESUMO
O propósito desse trabalho consiste em investigar a concepção de criança, na ótica dos educadores da Escola Municipal Professor Mateus Viana, em Caicó/RN. Para a realização desse estudo utilizou-se A Ludicidade como Coadjuvante ao Desenvolvimento e Aprendizagem da Criança.
Como técnica de pesquisa a abordagem qualitativa, desenvolvida através de uma pesquisa de campo. Como suporte metodológico, utilizou-se o questionário, contendo 05 questões abertas (subjetivas), aplicado in loco, onde foram interrogados 06 educadores, sendo 04 professores do Ensino Infantil, 01 diretora e 01 supervisora, buscando aprofundar o estudo a cerca da temática em questão. Através de observações, visitas in loco, da análise dos discursos emitidos pelos educadores, bem como do vasto acervo literário, é que foi possível a elaboração deste trabalho, destinado tanto às crianças de um modo em geral, quanto aos profissionais de educação infantil. As informações obtidas através dos relatos, bem como, das observações, permitiram perceber que a visão que os professores de educação infantil têm sobre criança é fragmentada e/ou conservadora, pois muitos não estão preocupados com a formação integral da criança, sim com o “cuidar”. Um dado interessante que nos chamou a atenção é que, apesar de as crianças estudarem no pré-escolar, sua rotina assemelha-se a uma instituição de cunho assistencialista (creche) diferindo apenas no horário de atendimento, posto que na creche é integral.


INTRODUÇÃO
A forma como a infância foi sendo concebida ao longo dos séculos, até os dias atuais, é fruto de diversas críticas, debates e, conseqüentemente, de estudos que vêm sendo aprofundados constantemente.
A infância é hoje tematizada em várias áreas do conhecimento, e é motivo de discussão em diversos segmentos da sociedade civil. Mas, isso só foi possível, graça às modificações ocorridas na sociedade na forma de se conceber a criança.
A criança, atualmente, vive um momento fecundo se comparamos a forma como essa era concebida no início dos séculos. Contudo, isso não significa dizer que tal mudança represente sempre progresso, pois, apesar dos avanços em termos de inclusão da criança na sociedade, observa-se que muita coisa ainda precisa ser feita para que os direitos reservados a esse ser, desde a Constituição Federal de 1988, tornem-se fato.
Apesar dos avanços e das conquistas adquiridas (como no caso do Estatuto da Criança e do Adolescente e da nova LDB), a maioria das crianças no Brasil, ainda vive em um meio bastante adverso, onde são excluídas socialmente, violentadas, maltratadas física e psicologicamente, sem contar que muitas estão fora da escola, pois não têm acesso aos bancos escolares, (falta de vagas nas escolas), seja porque têm, que parar de estudar para ajudar no sustento da família (trabalho infantil). O certo, é que a situação de grande parte das crianças brasileiras é bastante caótica.
Debruçando o olhar mais especificamente para a educação infantil, objeto deste estudo, verifica-se que, apesar do espaço social concebido a esta etapa, como sendo o primeiro segmento do ensino básico, a educação oferecida à criança de zero a seis anos não se encontra em comum acordo com o que dispõe a nova LDB (lei n: 9394/96), pois é possível encontrar com grande facilidade escolas em péssimas condições físicas, propostas pedagógicas ultrapassadas, sem falar, na falta de profissionais qualificados para atender a essas crianças ativas, curiosas, carentes de conhecimento, presentes no contexto atual.
É com essa preocupação que se buscou investigar as concepções de criança sob o prisma dos educadores, mais especificamente, dos professores da educação infantil, da Escola Municipal Professor Mateus Viana, em Caicó/RN, escolhida como cenário e fonte de pesquisa deste estudo. O mesmo foi realizado através de pesquisa bibliografia, visitas in loco e aplicação de questionário. Este foi desenvolvido de janeiro a outubro de 2002.
O universo da pesquisa constou de 06 educadores: 04 professores do ensino infantil, 01 diretora e 01 supervisora. A pretensão de investigar a concepção da diretora e da supervisora da escola deve-se ao fato de considerá-las como educadores, pois, a partir do momento que o sujeito passa a interagir, participar e intervir na formação do indivíduo, ele é um educador.
A escolha dessa temática surge da inquietação e desconhecimento da pesquisadora na forma como a criança é vista atualmente. Por conseguinte, a escolha dessa escola ocorreu em virtude de residi no mesmo bairro, de conhecer a clientela, manter contato a priore e, principalmente, por querer conhecer mais a fundo a realidade da escola em questão.
Assim sendo, buscou-se desenvolver esse estudo em três capítulos, para que se tenha uma visão mais acurada no objeto de investigação. Por essa razão convida-se o leitor a prossegui conosco pelo seguinte percurso.
No primeiro capitulo, faz-se um breve resgate histórico da concepção de criança, destacando-se os caminhos pelos quais estas foram sendo concebidas e tratadas ao longo dos séculos, até os dias atuais, buscando e compreendendo a criança na condição social de ser histórico e cultural, cabendo se salientar que a analise das modificações votadas ao conceito de criança infância é feito à luz das mudanças ocorridas na forma de organização da sociedade.
Seguindo o percurso histórico, enfatiza-se a criança no Brasil, focalizando a forma como ela foi sendo concebida e tratada na sociedade brasileira. Na ocasião, enfoca-se a criança na contemporaneidade brasileira, destacando as conquistas e os percalços enfrentando por ela em nosso país. Ainda neste capitulo, abordam-se as tendências pedagógicas e suas influências nas concepções de crianças, mostrando como a mesma é concebida nas principais tendências e/ou abordagens.
No segundo capítulo, pretende-se historiar o quadro de atendimento à criança na educação infantil, buscando as origens das iniciativas destinadas à criança de 0 a 6 anos. Nele encontra-se, também, a significação dos conceitos creche, pré-escola e educação infantil.
No terceiro capítulo, e último desta obra, destaca-se a caracterização da escola – objeto deste estudo – em seguida, apresentam-se os dados coletados seguidos de suas respectivas analises, quando serão confortados com as teorias vigentes acerca do tema exposto.
Por fim, destacam-se as considerações finais, onde se faz um apanhado das principais questões que se destacaram ao longo desta obra, no caso deste estudo, a concepção de infância.
Espera-se que este trabalho venha contribuir para uma reflexão (entre educadores, estudantes, leigos e interessados) acerca do ser criança, por conseguinte, na prática pedagógica dos educadores, enquanto agente de transformação e transmissão de conhecimento.
O tema criança é inesgotável, “polêmico” e cheio de “controvérsias”, pois a concepção de criança não se apresenta de forma homogênea em uma dada sociedade, por essa razão não foi possível esgotá-lo nesse estudo, permitindo que muitos aspectos venham a ser explorados/investigados em posteriores pesquisa. Há muito que se aprende com a criança em sua relação de concretude com o mundo. E os educadores, o que pensam sobre isso?
CAPÍTULO I
CRIANÇA: HISTÓRIA E CONCEITO
O propósito deste capítulo consiste em mostrar um breve histórico do conceito de criança, focalizando-se o caminho pelo qual esta foi sendo concebida e tratada, ao longo dos séculos, até os dias atuais, tendo como ponto de referência às idéias de Philippe Ariès. Destaca-se também, a criança no Brasil, quando serão enfatizadas as transformações ocorridas, por esta, dentro de uma perspectiva histórica e cultural.
Logo após, enfoca-se a criança na contemporaneidade brasileira, ou seja, como ela vem sendo tratada e/ou concebida no contexto atual.
Por fim, abordam-se as tendências pedagógicas e suas influências nas concepções de criança.
Nossa pretensão, portanto, não é estudar a criança como um problema em si, mas, sobretudo, entendê-la no seu contexto histórico, político, econômico e cultural.
1.1 História cultural da criança.
A retrospectiva histórica e cultural do conceito de criança revela que esta foi concebida e tratada de diferentes formas, dependendo da classe social a qual pertencia e do grupo étnico do qual fazia parte, em diferentes momentos e lugares da história da humanidade.
Nos séculos XII e XIII, não se afirmava, na iconografiada época, a representação positiva da idéia de “ser criança”. Até mesmo as estátuas eram ornamentadas com o corpo de adulto. Somente as iconografias profanas reservavam inscrições sobres às “idades da vida” destacando a criança. (NUNES e SILVA, 2000).
De acordo com ARIÈS (1978), foi somente no século XIII que surgiram os ícones de simbolização peculiar de alguns tipos de crianças um pouco mais próximo do sentido moderno: o primeiro tipo de representação era religioso, onde as crianças eram concebidas como um anjo com aparência de um rapaz. “O segundo seria o modelo e o ancestral de todas as crianças da história da Arte:o menino Jesus ou Nossa Senhora menina. O terceiro apareceu na fase gótica: a criança nua, porém, sempre representada como assexuada”.
Até o fim do século XIII, não existiam crianças caracterizadas por uma expressão particular, e sim homens de tamanho reduzido. As crianças eram vestidas tais quais os adultos. (id)
Percebe-se que houve uma lenta mudança entre o século XII e XIV acerca do ser criança, ou seja, há pouca diferença na forma como a sociedade concebe a criança na passagem desse século (XII), como pode ser observado, no percurso da história.
NUNES e SILVA, (op cit) comentando ARIÉS, informam que, no século XIV, a iconografia acerca do ser criança se estabeleceu e fixou seus traços essenciais, que permaneceram quase inalterados até o século XVIII.
Estes também acrescentam que no século XV as crianças ainda andavam misturadas com os adultos e, com eles, participavam de festas, trabalhos e reuniões, sempre correndo e dando saltos no ambiente supostamente reservado aos negócios do adulto. Nessa fase da história, os limites entre infância e adolescência eram incertos e mal percebidos.
Um século depois (XVI), pouca mudança houve na concepção de criança. Nessa época, o sentimento de infância era de que a criança era uma coisa “engraçadinha”, uma espécie de ser “exótico” e angelical. Tal sentimento não deixava perceber a criança como um processo, ou seja, como sujeito de sua própria história. (id)
Ainda comentando o século XVI, ARIÈS (op cit) revela que, ao analisar a iconografia, os diários, túmulos, documento e vocabulário desse século, percebeu que neles a criança é muito pouco representada e, quando é, aparece como um adulto em escala menor. Antes dessa época, a criança não era diferenciada do adulto e participava igualmente de várias manifestações sociais.
Mas, é somente no final do século XVI e início do XVII que surge uma radical mudança na pedagogia familiar e social. A criança havia conseguido um lugar junto aos seus pais. Lugar este que, até então, não poderia ter ocupado, uma vez que o costume mandava que a criança fosse confiada a estranhos. A criança, nessa época, tornou-se um elemento indispensável à vida quotidiana, além do que a vida familiar se estendeu a quase toda a sociedade. (NUNES e SILVA, 2000).
Corroborando esse pensamento, SCORSATO (1998) destaca que é apenas no início do século XVII que os adultos modificam sua concepção de infância e concede uma visão nova à criança, o que significa ainda que se lhe reconheça um lugar privilegiado na família e que se faça dela o seu centro. Havia, nesse século,uma manifestação de medo da infância expressa através da filosofia e da teologia. A criança aqui aparecia como símbolo da força do mal, do pecado original, o que evidenciava o ponto de vista da natureza humana corrompida.
A partir do século XVII, sob a influência dos reformadores moralistas, pouco a pouco se admitia que a criança não era preparada para a vida, cabendo aos pais a responsabilidade pela formação moral e espiritual dos filhos, gerando o aparecimento de novos sentimentos nas relações familiares. Os pais passaram a enviar seus filhos à escola onde recebiam a sólida formação proclamada pelo pensamento moralista da época. (ARIÈS apud MIRANDA, 1983)
Observa-se que nesse século a criança começa a adquirir mais espaço na família e, conseqüentemente, na sociedade. Assim, NUNES e SILVA (op cit) revelam que, no final do século XVII, já se observa o começo de uma separação entre o mundo da criança e o mundo do adulto. Essa separação, segundo eles, é irreversível, pois cresce até o fim do século XIX.
Contudo, KRAMER (In KRAMER e LEITE 1996) registra que a idéia de infância aparece com a sociedade capitalista, urbano-industrial, na medida em que mudam a inserção e o papel social da criança na comunidade. Se, na sociedade feudal, a criança exercia um papel produtivo direto “de adulto”, na sociedade burguesa ela passa a ser alguém que precisa ser cuidada, escolarizada e preparada para uma atuação futura. Esse conceito de infância é determinado historicamente pela modificação nas formas de organização da sociedade.
De acordo com PINHEIRO (1998), anteriormente à sociedade industrial, a duração da infância se limitava à tenra idade em que ela necessita dos cuidados físicos para sua sobrevivência, ou seja, tão logo seu desenvolvimento físico fosse assegurado – aproximadamente aos sete anos -. Para ilustrar sua fala, a autora cita ARIÈS (ibid, p. 43) quando comenta que a criança passava a conviver diretamente com adultos, compartilhando do trabalho e dos jogos a todo o momento, uma vez que a socialização acontecia no convívio com a sociedade, não sendo determinada nem controlada pela unidade familiar.
KRAMER (op cit) mais uma vez se fundamenta em ARIÈS para informar que o sentimento moderno de infância corresponde a duas atitudes contraditórias dos adultos. Uma considera a criança como um ser ingênuo, inocente e puro e é traduzida por aquilo que ele chamou de “paparicação”; reservada a criancinhas em seus primeiros anos de vida. A segunda atitude, surge simultaneamente à primeira, mas se contrapõe a ela, tomando a criança como um ser imperfeito e incompleto, que necessita da “moralidade e da educação feita pelo adulto”.
Já para PINHEIRO (op cit), a idéia moderna de infância foi determinada socialmente pela organização social capitalista, defendida pelos interesses de uma classe ascendente, a burguesia. Entretanto, a idéia de infância que se desenvolveu e chegou até nossos dias não exprime seu fundamento histórico. Ao contrário, trata-se de um conceito interno, universal e natural, sendo dissimulada a dimensão social da relação criança com o adulto e a sociedade.
AMARILHA (199_) coloca que – do ponto de vista histórico -, a infância surge a partir do século XVIII. Até então, não se encontrava um corpus de conhecimentos, nem tampouco um conceito formulado para esse período de desenvolvimento humano entre as várias ciências. Nesse sentido, as crianças participavam da vida da sociedade com cuidados especiais às suas necessidades.
1.2. Conceito de criança
Compilando a literatura existente, percebe-se que a palavra infância foi concebida e tratada de diferentes maneiras em distintos momentos da história da humanidade.
Até o século XVII, a criança tinha pouca importância para a sociedade, por conseguinte para a família. De acordo com ARIÈS (ibid, p. 19), nesse século, a criança ainda era vista como um ser frágil, indefeso, e a expressão usada para designá-la era “petit enfant” que significava “criança pequena” ou “criancinha”.
AMARILHA (ibid) também comenta que não havia uma preocupação maior com essa fase da vida, pois o período era marcado pelo alto índice de mortalidade. Sendo seres tão transitórios, não valia a pena dedicar-lhes sentimentos mais profundos e duradouros. As crianças eram deixadas para serem criadas por serventes, amas-secas, até que pudessem ter certa autonomia para o convívio com os adultos e chegasse a lhes ocupar o lugar.
De acordo com o dicionário Latino-Português de 1962, a palavra infância advinda do latim infantia significava “incapacidade de falar, nudez”. Esse conceito deriva do fato de se considerar que até os 7 anos a criança era incapaz de falar, por conseguinte “incapaz de pensar”, “incapaz de expressar”, gerando-se daí uma atitude condescendente do ponto de vista intelectual que revela a condição subalterna a que eram submetidas às crianças.
LAJOLO (In FREITAS 2000) revela que a constante necessidade de recorte e afirmação, de busca de precisão cada vez maior do conceito de infância fê-la buscar o dicionário Aurélio, que navega rente à psicologia em seu verbete relativo à infância, quando diz que esta significa: período de vida que vai do nascimento à adolescência, no qual o crescimento se faz, concomitantemente, em todos os domínios e, que, seguindo os caracteres anatômicos, fisiológicos e psíquicos, divide-se em três estágios: primeira infância, de zero a três anos; segunda infância, de três a sete anos; e terceira infância, de sete anos até a puberdade.
Contudo, SCORSATO (id) nos mostra que, no século XVIII, a criança era vista como um brinquedo. A palavra usada para designá-la era Poupart, que significa boneca.
Para reforçar tal visão, a autora cita BANDINTE (apud SCORSATO,1998) quando relata que: “… Poupart é considerado com muita freqüência pelos pais como um brinquedo divertido do qual se gosta pelo prazer que proporciona, e não pelo seu bem. É uma espécie de pequeno ser sem personalidade, um jogo nas mãos do adulto… mas quando tem idade e se torna sério, não nos interessa mais. À familiaridade excessiva sucede uma severidade exagerada, ou uma indiferença gélida”.
No outro extremo, situam-se as idéias de ROUSSEAU quando cita que a criança é um ser com características próprias, não sendo admissível que continuasse sendo encarada como um adulto em miniatura. A infância, para esse filosofo, constituía uma fase da vida e não uma simples preparação para a vida. A criança, segundo ele, teria que se comportar como ela é e não como os adultos gostariam que ela fosse. ROUSSSEAU foi o primeiro a considerar a criança enquanto tal, com sentimentos, desejos e idéias próprias, diferentes dos adultos. (ROUSSEAU apud PINHEIRO, 1998).
No século XIX, a criança passa a ter novo significado. Surge assim um novo termo para designá-la. Esta passa a ser chamada de “baby”, termo usado para crianças de poucos meses de nascimento. NUNES E SILVA (ibid, 27)
PEREIRA e SOUZA (apud KRAMER e LEITE) acrescentam que, desde o final desse século (XIX), percebe-se uma tendência crescente de separar o mundo das crianças do mundo dos adultos. A educação das crianças, que acontecia diretamente ligada à vida nas reuniões de trabalho e lazer, foi substituída pela aprendizagem escolar. Começa, então, um longo processo de enclausuramento de crianças, mas também dos adultos, que se estende até os dias atuais, que vai desde a escolarização dos modos mais sofisticados e sutis de confinamento espacial.
1. 3. Focalizando a Criança no Brasil
Numa breve incursão pela história da criança no Brasil. Observa-se que a “preocupação” com esta, data somente do final do século XIX.
De acordo com NUNES e SILVA (op cit), o Brasil só reconhece a criança no final do século XIX. Relegada aos escravos, desde o período colonial, e mantida longe da cultura social, a criança brasileira tem uma história marcada pelo silêncio e pela violência real e simbólica.
Os autores também citam que os jesuítas foram os primeiros a criarem um espaço institucional, bem definido, para o tratamento das crianças brasileiras que eram em sua maioria, formadas pelos filhos dos índios. Para os Jesuítas, a infância era o momento oportuno para a assimilação das regras de disciplina e da fé. Os jesuítas trouxeram da Europa a idéia da infância santa inspirada na iconografia da infância do menino Jesus. Por isso, eles acreditavam na catequização e na conversão dos indiozinhos, como caminho para atingir o grupo e toda a sociedade indígena.
Ainda, conforme CHAMBOULEYRON (In PRIORE, 2000), a infância estava sendo descoberta nesse momento no velho mundo. Resultado da transformação nas relações entre indivíduo e grupo que ensejava o nascimento de novas formas de afetividade e a própria “afirmação do sentimento da infância”, na qual a Igreja e Estado tiveram um papel fundamental. Foi esse movimento também “que fez a companhia escolher as crianças indígenas como “papel branco”, a cera virgem, em que tanto se desejava escrever ou inscrever-se” a fé cristã..
A infância no Brasil foi marcada por uma longa história de exploração da mão-de-obra infantil. As crianças pobres sempre trabalharam. Para quem? Para seus donos, no caso das crianças escravas da Colônia e do Império. Para os “capitalistas” do início da industrialização, como ocorreu com as crianças órfãs, abandonadas ou desvalidas, a partir do final do século XIX; Para os grandes proprietários de terras como bóias-frias; nas unidades domésticas de produção artesanal ou agrícola; nas casas de família; e, finalmente, nas ruas para manterem a si e as suas famílias. RIZZINI, (In PRIORE 2000)
Para PRIORE (2000), a dicotomia dessa sociedade, dividida entre senhores e escravos gerou outras distorções, até hoje, presentes na sociedade. Tomemos o exemplo do trabalho infantil. Dos escravos desembarcados no mercado do Valongo, no Rio de Janeiro do início do século XIX, onde 4% destes eram crianças. Destas, apenas um terço sobreviveu até os dez anos de idade. A partir dos quatro anos muitas delas já trabalhavam com os pais ou sozinhas, pois se “perder” de seus genitores era coisa comum.
No século XIX, a alternativa para os filhos dos pobres não seria a educação, mas a transformação destes em cidadãos úteis e produtivos na lavoura. Enquanto isso, os filhos de uma pequena elite eram ensinados por professores particulares. No final desse século, o trabalho infantil continua sendo visto pelas camadas subalternas como “a melhor escola”. O trabalho (explica uma mãe pobre) é uma distração para a criança. Se não estivesse trabalhando, vai inventar moda, fazer o que não presta. (id)
A pobreza e a falta de escolarização da criança brasileira, ao longo de sua história, tornam as teses européias absolutamente inadequadas ante as realidades de uma sociedade em que, como explica “uma menina de rua”: “Sonhos não enchem barriga”! a estratificação da Sociedade velha divisão dos tempos da escravidão, entre aqueles que muito possuem e os que nada têm só fez agravar a situação das nossas crianças. Acrescenta PRIORE (op cit).
Com base nesse relato, RIZZINI (In PRIORI, 2000) acrescenta que a história das crianças, mostra que em muitas regiões miseráveis do país, incluindo os bolsões de pobreza nas grandes cidades, o estudo tem pouco valor frente à necessidade de sobrevivência. Dentre as causas dessa desvalorização estão: jornadas fatigantes de trabalho, escolas distantes e despreparadas para lidar com seus alunos, mantendo as crianças longe das salas de aula.
Esse autor ainda relata que as crianças brasileiras são, em sua maioria, geradoras de riqueza para o país, juntamente com suas famílias, mas, no entanto, vivem do trabalho semi-escravo, com total falta de perspectiva de vida.
ARIÈS (apud PERRENOUD, 2001) coloca que durante muito tempo, as crianças não foram consideradas seres à parte, protegidas ao máximo das ameaças, das relações de poder, da promiscuidade, do dinheiro, do trabalho. Elas formavam a mão-de-obra familiar, agrícola e industrial; viviam com os adultos e, desde a mais tenra idade, integravam-se às redes sociais complexas. Durante muito tempo, os adultos utilizaram sem escrúpulos seus meios de dominação para reduzir as crianças ao silêncio, para fazê-las obedecer e trabalhar.
Boa parte das crianças brasileiras enfrenta atualmente, um cotidiano bastante adverso que as conduz desde muito cedo a precárias condições de vida, ao trabalho infantil, ao abuso e exploração por parte de adultos. Entretanto, existem crianças que são protegidas de todas as maneiras, recebendo de seus familiares e da sociedade em geral todos os cuidados necessários ao seu desenvolvimento. Essa dualidade revela a contradição e conflito de uma sociedade que não resolveu ainda as grandes desigualdades sociais presentes na sociedade. (RCNEI, 1998).
1. 4. A criança na contemporaneidade brasileira.
Analisando a história da criança e/ou a infância no Brasil, observa-se que esta foi marcada pela repressão, marginalização e exploração nas mais diferentes formas, tanto pela “família” como pela sociedade.
Para KRAMER (In KRAMER e LEITE, 1996), a infância hoje é tema de discussão em várias áreas do conhecimento e motivo de mobilização de diversos movimentos da sociedade civil, que reconhece a criança como cidadã e luta para que os direitos sociais afirmados na letra da Constituição desde 1988 façam valer, pois apesar dos “avanços” adquiridos no que dispõe a Lei, a criança hoje, ainda, vem sendo excluída, violentada, abusada sexualmente e maltratada física e psicologicamente.
A despeito disso, CRAIDY (In CRAIDY e KRAMER, 2001), comenta que a Lei de Diretrizes e Bases da educação – LDB, assim como as outras Leis recentes a respeito da infância no Brasil são fruto da Constituição Federal de 1988, que definiu uma nova doutrina em relação à criança, que é a doutrina da criança como sujeito de direitos. Desde essa Constituição (1988) ficou legalmente definida que os pais, a sociedade e o poder público têm que respeitar e garantir os direitos da criança. Direitos esses definidos no artigo 227 que diz:
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência e opressão.
Nesse sentido, nem os pais, nem as instituições de atendimento ou qualquer membro da sociedade ou do governo poderão fazer com as crianças o que bem entenderem e/ou considerarem válido. Assim sendo, todos são obrigados a respeitar os direitos definidos na constituição brasileira que reconheceu a criança como um cidadão em desenvolvimento. (CRAIDY, id).
Ainda comentando os direitos reservados às crianças, OLIVEIRA (2002) informa que a década de 90 foi palco de novos marcos e/ou conquistas. Uma delas foi a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que caracterizou as conquistas dos direitos das crianças promulgados pela Constituição. Essa “conquista” preparou o ambiente para a provação da nova LDB – Lei nº 9394/96 que estabelece a educação infantil como etapa inicial da educação básica. Essa foi uma conquista histórica, onde as crianças brasileiras são tiradas de seu confinamento em instituições de cunho assistencialista.
Contudo, ainda assisti-se ao fato de muitas crianças ficarem fora da escola, sem contar nos inúmeros casos de crianças estupradas, violentadas e exploradas física e emocionalmente.
É com essa preocupação que KRAMER (id) relata: “a situação das crianças é ‘gravíssima’. Há cerca de 60 milhões de brasileiros na faixa etária de 0 a 17 anos, seis em cada dez crianças com menos de um ano vivem em casas, sem saneamento básico, mais de 15% das crianças e adolescentes pertencem a famílias com renda per capita de até meio salário mínimo”.
Atualmente, quase 60% das crianças brasileiras são trabalhadores. No Nordeste são analfabetos, e entre eles, a taxa de evasão escolar atinge 24%. No Sul do país o cenário não é muito diferente. Trabalhando em lavouras, as crianças interrompem seus estudos na época da colheita. O trabalho, como forma de complementação salarial para famílias pobres miseráveis, sempre foi priorizado em detrimento da formação escolar. (PRIORE, 2000).
No caso das crianças brasileiras, a lei já proíbe o trabalho infantil a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.º 8.069, de 13 de junho de 1990). Desde essa época o trabalho infantil foi proibido até os 14 anos. Contudo, boa parte das crianças ainda enfrenta um cotidiano bastante adverso que as conduz desde cedo a precárias condições de vida, ao trabalho infantil, ao abuso e à exploração por parte de adultos.
A situação da criança no Brasil não pára por aí. De acordo com RIZZINI, (In PRIORE, 2000) 40% das crianças de até 14 anos, no nosso país, vivem em famílias cuja renda média é de sessenta reais por pessoa. No Nordeste, a situação ainda é mais crítica, 63% das famílias não têm rendimento.
É com essa preocupação que GADOTTI (In FLEURY, 2000) faz o seguinte desabafo: “vivemos um tempo em que a criança é vítima da crise geral da sociedade. A violência generalizada não perdoa a infância, quase sempre indefesa. Vivemos em um país onde a massa da população é menor de idade; no entanto, ela é postergada, utilizada como canal de exploração do adulto, ou simplesmente abandonada, quando se trata das classes subalternas. Um país onde milhares de crianças morrem anualmente de fome”.
Tal visão assemelha-se a de SCORSATO (1998) quando revela que a ética da nossa modernidade é ter sucesso e, para isso, convoca os filhos, as crianças para satisfazerem certos objetivos predeterminados, que dêem resultados como as máquinas.
Ainda relatando o problema da criança brasileira, GODOTTI (op cit) afirma que este é quase universal. No âmbito do lar, há prêmios e castigos em função dos valores instituídos, onde a criança é “indesejada”, assim como os velhos, pois não produzem. É dito que se ama uma criança embora, contrariamente, no cotidiano ela é apenas tolerada. Esta é a realidade para grande parte das crianças no contexto atual.
Já para PEREIRA e SOUZA (In KRAMER e LEITE, 1998) as crianças, atualmente, estão com agenda lotada. A televisão se transformou em babá. Pais ausentes, carinhos transformados em objetos. Erotização da infância, sexualidade, publicidade, individualismo desencadeado pela ausência do outro. Criança sozinha, criança que manda nos pais. Esses são alguns dos fragmentos que compõem o contexto da criança na sociedade contemporânea.
Segundo DAMAZIO (1994), a realidade urbana contemporânea impõe à criança um ritmo de vida alucinante. De um lado, o convívio tenso das desigualdades sociais e, do outro, um bombardeio múltiplo de informações. A subjetividade da criança se tece no contato com tais realidades.
Nessa ótica, PEREIRA E SOUSA (1998), a criança no mundo moderno, também veste asas de anjos da história. As asas abertas talvez não signifiquem promessas de vôo. Seriedade. Sisudez. É preciso tornar-se um sujeito de razão. Prontidão. Amadurecimento. Pressa. Judô. Informática. Natação. Criança vivendo na rua. Trabalho infantil. Erotização. Prostituição. Objeto de consumo. Apressamento da infância. Empurada, seduzida cada vez mais para o futuro mundo adulto. Que imagens guardar de tudo isso? Que dialogo manter com um tempo que se evapora, nos nossos pés sem deixar rastros ou marcas?
Para finalizar, JOBIM e SOUZA et al (apud KRAMER E LEITE, 1998) comentam que os filhos já não se reconhecem como continuidade da história dos pais, tornando-se estranhos na própria casa. Descoberta pelo mercado, a criança vive o paradoxo de ser consumidora e objeto de consumo ao mesmo tempo. Transformada por nós, sem qualquer piedade ou indignação, em mercadoria da época, a criança contemporânea tem como destino flutuar erraticamente entre adultos que já não sabem o que fazer com ela.
Enfim, a modernidade não trouxe “avanços” para a posição social da criança e para elevação da compreensão do seu papel.
1. 5. Tendências pedagógicas: influências nas concepções de criança.
Segundo assinala MIRANDA (1983) podem-se distinguir duas concepções distintas de criança na educação: uma na pedagogia tradicional e a outra na pedagogia nova. Estas conservam a idéia de natureza infantil. Para se compreender tal visão, a autora cita CHARLOT (apud MIRANDA, 1983) quando revela que todas as duas abordam a criança do ponto de vista de sua “educabilidade e sua corruptibilidade”, mesmo que essa idéia seja completamente diferente.
MIRANDA (id) ainda comenta que, na pedagogia tradicional, a idéia de criança é a do que ela deverá ser se for adequadamente educada. Já a pedagogia nova vê a criança como um ser pleno para a auto-realização em cada etapa do desenvolvimento. A criança é, portanto, naturalmente boa e ingênua, podendo ser corrompida se não protegida e respeitada. Nas duas pedagogias, a criança é, portanto, definida como um tempo negativo (pedagogia tradicional) ou tempo positivo (pedagogia nova) de uma natureza infantil.
Tomando-se a pedagogia como tema de análise, percebe-se nas duas opções urgente determinada “tradicional” e “nova” estar presente a dupla concepção de infância. Para a pedagogia tradicional, a natureza da criança é originalmente corrompida, a tarefa da educação é discipliná-la e inculcar-lhes regras, através de intervenção direta do adulto e da constante transmissão de modelos.(KRAMER, 1992)
Para essa autora, a pedagogia “nova” ou “moderna”, ao contrário, concebe a natureza da criança como inocente, original; a educação deve proteger o natural infantil, preservando a criança da corrupção da sociedade do adulto, mas na liberdade da criança e na expressão de sua espontaneidade. Na concepção de infância elaborada pela pedagogia nova torna-se possível o surgimento de uma psicologia científica da criança e de um método genético a partir do qual a criança deve ser compreendida em função do seu passado individual. Ambas as perspectivas tratam a criança como um ser abstrato. Tal quadro pedagógico camufla ideologicamente a significação social da infância, quer seja, filosófico ou pedagógico.
SILVA (2002) revela que após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/90) passou-se a revalorizar as idéias de PIAGET, VYGOTSKY E WALLON.
PIAGET (apud PINHEIRO, 1998) opõe-se claramente à concepção de criança enquanto um adulto em miniatura. Para ele, há uma especificidade necessária à característica, aos diferentes momentos do desenvolvimento da criança. Nesse processo, a realidade percebida vai sofrendo um pouco de construção e de reconstrução, até que se aproxima daquela aprendida pelo adulto.
Para PIAGET, diferentes estágios do desenvolvimento caracterizam formas diversificadas, mediante as quais o indivíduo interage com a realidade e vai, gradativamente, organizando seus conhecimentos e promovendo a sua adaptação.
As idéias de VYGOTSKY (apud MACHADO, 2000), assemelham-se as de PIAGET quando contesta as teorias que descrevem a criança como um adulto em miniatura ou como um ser que evolui acumulando e reproduzindo conhecimentos. A criança para ele é um sujeito social criador e recriador de cultura.
Baseado na construção de uma epistemologia sócio-genética, ela chega à conclusão de que ao mesmo tempo em que a criança é transformada pelos valores culturais do seu ambiente, ela transforma esse ambiente. Para esse autor, o conhecimento é fruto das interações sociais que se estabelecem pela mediação dos signos culturais construídos na coletividade.
WALLON (apud OLIVEIRA, 2002), tal como VYGOSTSKY, considera o desenvolvimento humano resultante de uma dupla história que envolve as condições do sujeito e suas sucessivas situações que o envolve. Para ele a atividade da criança só é possível graças aos recursos oferecidos tanto pelo instrumental quanto pela linguagem utilizada ao seu redor, sendo a mediação feita por outras pessoas particularmente fundamental na construção do pensamento e da consciência de si.
CAPÍTULO II
A CRIANÇA NA EDUCAÇÃO INFANTIL: PANORAMA HISTÓRICO
Há algumas décadas a família era responsável por tida à formação moral e ética da criança, cabia à escola a tarefa de transmitir conhecimentos. Atualmente a situação é completamente distinta. Com o avanço tecnológico e a ascensão profissional da mulher, as crianças são levadas à escola cada vez mais cedo. Se antigamente apenas algumas deixavam o ambiente doméstico aos quatro anos para brincar no “jardim de Infância”, agora várias freqüentam as creches desde bebês.
Atualmente, a educação infantil, é considerada a etapa mais importante na escolarização da criança de zero a seis anos, uma vez que ela é o alicerce do processo educativo, cuja finalidade é desenvolver a criança integralmente em todos os níveis: sociais, psicológicos, emocionais e cognitivos.
Partindo dessa premissa, pretende-se neste capítulo historiar o quadro do atendimento à criança na educação infantil, buscando as origens do tipo de atendimento destinado a esta, em cada época, quando serão focalizados os aspectos políticos, sociais e educacionais contidos nessa abordagem.
2. 1. Traçando os caminhos da criança na educação infantil.
Para compreender o atual contexto da educação infantil no Brasil, faz-se necessário conhecer a história do atendimento à criança na faixa etária de zero a seis anos de idade, ou seja, buscam-se aqui as origens dos diversos tipos de iniciativas destinadas à infância, ao longo da história do país, procurando compreender seu significado em cada época.
Conforme cita BUJES (In CRAIDY e KAERCHER, 2001) a educação da criança, durante muito tempo, foi considerada uma responsabilidade das famílias ou do grupo social ao qual pertencia. Por um bom período da história da humanidade, não houve nenhuma instituição responsável por compartilhar essa responsabilidade pela criança com seus pais e com a comunidade da qual faziam parte.
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Nos séculos XV e XVI, foram criados modelos educacionais para responder aos desafios estabelecidos pela maneira como a sociedade européia então se desenvolvia. Com o surgimento do desenvolvimento científico, da expansão comercial e das atividades artísticas ocorridas no período Renascentista estimulou-se o surgimento de novas visões sobre a criança e como ela deveria ser educada. (OLIVEIRA, 2002)
BUJES (op. cit) nos informa que o surgimento das instituições de educação infantil esteve de certa forma, relacionado ao nascimento da escola e do pensamento pedagógico moderno, que pode ser localizado entre os séculos XVI e XVII. A escola muito parecida com a que conhecemos hoje, organizou-se porque ocorreu um conjunto de possibilidades: a sociedade na Europa mudou muito com a descoberta de novas terras, novos mercados, com o desenvolvimento científico e também com a invenção da imprensa, que permitiu que muitos tivessem acesso à leitura.
Na concepção de OLIVEIRA (op. cit), as instituições de educação infantil nasceram no século XVIII, em resposta à situação de pobreza, abandono e maus-tratos das crianças pequenas, cujos pais trabalhavam em fábricas, fundições e minas criadas pela Revolução Industrial que se implantava na Europa.
Nesse contexto, ABRAMOVAY e KRAMER (1985) acrescentam que a necessidade por pré-escola surge como reflexo direto das grandes transformações sociais, econômicas e políticas que ocorreram na Europa, mais precisamente, na França e Inglaterra a partir do século XVIII. As creches, nessa época, surgem com caráter assistencialista, visando afastar as crianças pobres do trabalho servil que o sistema capitalista em expansão lhes impunha.
De acordo com PINHEIRO (1998), é na França que se esboça a primeira tentativa de trazer para os estabelecimentos filantrópicos, responsáveis pelas crianças carentes a preocupação com as questões de natureza pedagógica.
A discussão sobre a escolaridade obrigatória, que se intensificou em vários países europeus nos séculos XVIII e XIX, enfatizou a importância da educação para o desenvolvimento social. Nessa época, a criança passou a ser o centro do interesse educativo dos adultos começando a ser vista como sujeito de necessidades, objetivos com expectativas, e que precisa de cuidados. A escola, para os que podiam freqüentá-la, tornava-se nesse momento um instrumento fundamental. (OLIVEIRA, op. cit)
Com os primeiros movimentos desencadeados no século XIX, convencionalmente chamados de Revolução Industrial, instala-se na Europa um gradual processo de transformação. Em decorrência dessas transformações, aumenta a participação da mulher no mercado de trabalho. A incorporação da mulher à força de trabalho faz com que a função de cuidar e educar as crianças com menos de 7 anos fique a cargo de instituições. Dessa forma, surge a oferta de asilos e de creches. Instituições de cunho meramente assistencialista. (KRAMER, 1992).
Contudo, FREITAS e KUHLMANN Jr. (2002) relatam que as primeiras iniciativas relacionadas com o que chamaríamos de “pré-escola” ou “educação infantil” surgem em Portugal, com as instituições educativas denominadas “casas de Asilo da Infância dos desvalidos”. Essas instituições surgiram ainda no século XIX, mais precisamente em 1834, pouco depois do término da guerra entre liberais e miguelitas.
ABRAMOVAY e KRAMER (op cit) ainda nos mostram que, no final do século XIX, uma nova função passa a ser atribuída à pré-escola, mais relacionada à idéia de educação do que à de assistência. São criados os jardins de infância nas favelas alemães por Froebel; nas favelas Italianas por Montessori e nas favelas Americanas por Rebody. A função da pré-escola, nessa época, era a de compensar as deficiências das crianças, sua miséria, pobreza e a negligência de suas famílias.
Comentando o final do século XIX, KUHLMANN Jr .(apud SOUZA, 1996) revela que nessa época as creches, asilos e jardins-de-infância eram propostos como parte de um conjunto de iniciativas destinadas à população pobre, que compunha uma nova concepção assistencial.
Já no Brasil, o atendimento massivo de crianças pequenas em creches e pré-escola tem uma história relativamente recente. Segundo assinala PINHEIRO (1998), o surgimento histórico da pré-escola no Brasil não se deu como num passe de mágica. Sua institucionalização foi precedida por um longo processo, no qual a preocupação com a educação da criança foi gradativamente assumindo formas cada vez mais sistematizadas, como se pode perceber acompanhando o percurso da história.
De acordo com OLIVEIRA (op cit), a história da educação infantil, de certa forma, tem acompanhado a história de outras partes do mundo – com características que lhes são próprias -. Até meados do século XIX, o atendimento de crianças pequenas em instituições como creches ou parques infantis, praticamente não existia no Brasil.
A despeito disso, FILHO (apud KRAMER, 1992) informa que durante o 1º período do descobrimento do Brasil, por volta de 1874, pouco se fazia no país pela infância “desditosa” tanto do ponto de vista da proteção jurídica, quanto das alternativas de atendimentos existentes.
Na ótica de KRAMER (1992), as primeiras iniciativas voltadas à criança partiram de higienistas que se dirigiram contra o alarmante número de mortalidades infantis, atribuídas por eles a duas causas: uma dizia respeito aos nascimentos ilegítimos, fruto da união entre escravos, ou dos senhores. A outra, referia-se à falta de “educação física, moral e intelectual das mães”, ou melhor, a sua negligência na medida em que permitiam o aleitamento mercenário (escrava de aluguel)
FILHO (apud KRAMER, 1992) ainda relata que de 1874 até 1889, aproximadamente, caracteriza-se pela existência de vários projetos elaborados por grupos particulares, em especial médicos, que tratavam do atendimento à criança.
Nesse contexto, KRAMER (op cit) comenta que a idéia de proteger a infância começava a despertar, contudo, o atendimento restringia-se a iniciativas isoladas que tinham um caráter localizado. Mesmo aquelas instituições dirigidas às classes desfavorecidas, como os três Institutos de Menores Artífices, fundados em Minas Gerais, em 1876 ou mesmo os colégios e associações de amparo à infância, além do 1º Jardim de Infância do Brasil, eram insuficientes frente à situação de saúde e educação da população brasileira.
OLIVEIRA (op cit) registra que, em 1885, os jardins de infância foram confundidos com as salas de asilos franceses, ou entendidos como início perigoso da escolaridade precoce.
De acordo com GEIB (1998), a educação infantil no Brasil assumiu diferentes funções e concepções. Nas primeiras décadas do século XX, predominaram a concepção médico-higienista, com o objetivo de proteger a criança do risco de doenças e mortes, intenções essas inseridas em um projeto maior de saneamento básico que pudesse conduzir o país à civilização e à modernidade.
JÚNIOR (apud GEIB, 1998) comenta que, no início desse século, foram implantadas as primeiras instituições pré-escolares nas indústrias, por força da necessidade de regulamentar as relações trabalhistas das mulheres, emergentes no sistema capitalista que se impunha.
Mas, é somente em 1908, que se institui a primeira escola infantil em Belo Horizonte e, em 1909, o primeiro jardim-de-infância municipal no Rio de Janeiro. (OLIVEIRA, op cit)
KISHIMOTO (apud SOUZA, 1996), comentando uma pesquisa sobre a pré-escola no Brasil, relata que as primeiras creches instaladas em São Paulo, no início da república, por volta de 1920, confundem-se com asilos infantis, por atender basicamente crianças órfãos, em regime de internato. Conhecidas por absorver funções de guarda das crianças, estas não merecem atenção do governo.
Em 1922, ocorreu no Rio de Janeiro, o Primeiro Congresso Brasileiro de Proteção à Infância, onde foram discutidos temas como a educação moral e higiênica, com ênfase no papel da mulher. Nesse congresso surgiram as primeiras regulamentações do atendimento às crianças pequenas em escolas maternais e jardins-de-infância. Acrescenta OLIVEIRA (ibid)
KRAMER (1992) comenta que a década de 30 é considerada como limite pelas modificações políticas, econômicas e sociais ocorridas no cenário nacional, que refletiram na configuração de instituições voltadas às questões de educação e saúde.
Em 1937, Gertúlio Vargas implanta o Estado Novo e a educação passa a se encarada como um instrumento que poderia garantir as novas gerações uma formação de acordo com os valores e normas preconizados pelo ideário daquela época.
KISHIMOTO (apud SOUZA, 1996) menciona que as novas unidades assistenciais que surgiram ao longo dos anos trinta contavam com professores normalistas subsidiados pelo governo. Essas unidades utilizavam o termo Jardim-de-infância, invés de escolas maternais. Seu objetivo era atender crianças das camadas populares, prestando assistência médica e atendimentos educativos, ao mesmo tempo.
OLIVEIRA (op cit) comenta que apesar da década de 30 ter sido criada algumas instituições oficiais voltadas à proteção à criança, foi na década de 40 que prosperaram iniciativas governamentais na área da saúde, previdência e assistência. O atendimento fora da família aos filhos que ainda não freqüentavam o ensino primário era vinculado à questão de saúde. Entendidas como mal necessário, as creches eram planejadas como instituições de saúde, com rotinas de triagem, lactário, peso, dentre outras.
Seguindo o percurso da história, a autora menciona que em 1943, com a consolidação das Leis do trabalho, o acesso a creches pelos trabalhadores foi ganhando novos contornos, pois a criação de creches por parte dos empregados nos locais de trabalho até então era considerado um ato de benemerência.
PINHEIRO (1998) revela que sob o ponto de vista da prática pedagógica propriamente dita, verificou que até 1945, uma situação de equilíbrio entre as concepções humanista tradicional e humanista moderna. Nesse período, no qual está englobando o escolanovismo, a criança é valorizada na sua autonomia e respeitada quanto aos seus interesses.
Até a década de 1950, as poucas creches que existiam, eram de responsabilidade de entidades filantrópicas laicas. O trabalho com as crianças nas creches tinha um caráter assistencial. A preocupação era alimentar, cuidar da higiene e da segurança física. Havia pouca valorização do trabalho orientado à educação e ao desenvolvimento intelectual e afetivo das crianças.(KRAMER, 1992)
Foi nessa época também que, o Ministério do Trabalho, passou a desaconselhar a instalação de creches pelas empresas, por considerar inadequada nas indústrias e muito dispendiosa a sua instalação. (OLIVEIRA, 2002)
Na década de 60, a pré-escola começa a ser configurada com a finalidade pedagógica de minimizar o alto índice de repetência, tornando-se um mecanismo preparatório que poderia garantir o sucesso escolar futuro. (PINHEIRO, 1998)
SOUZA (1996) revela também, que nessa década, uma mudança importante havia ocorrido na educação, onde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1961, Lei nº 4024/61 aprofundou a perspectiva apontada desde a criação dos jardins-de-infância, incluindo-a no sistema de ensino como pode ser observado no que dispunha os artigos desta a Lei:
Art. 23. A educação pré-primária destina-se aos menores de até 7 anos, e será ministrado em escolas maternais ou jardins-de-infância.
Art. 24. As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos serão estimulados a organizar e manter, por iniciativa própria ou em cooperação com os poderes públicos, instituições de educação pré-primária.
É somente a partir da década de 70 que a importância da educação da criança é reconhecida e as políticas governamentais começam a ampliar o atendimento em especial das crianças de 4 a 6 anos. Entretanto, essa educação ainda não estava assegurada pela legislação, o que dificultou sua expansão para esse nível de ensino. (KRAMER, 1992).
CAMPUS citado por ABRAMOVAY e KRAMER (1985), relata que nessa época a pré-escola no país se tornou um mito, sendo subitamente considera a “solução de todos os males, compensadora de todas as deficiências educacionais, nutricionais e culturais de uma população”.
OLIVEIRA (op cit) acrescenta que foi ainda nessa época aumenta da demanda por pré-escola, fato esse ocasionado pelo processo de municipalização da educação pré-escolar enquanto instituição pública, pois com a diminuição de vagas nas redes estaduais de ensino e sua ampliação nas redes Municipais, o percentual das receitas municipais passou de 25% dos gatos com o ensino.
Contudo, KRAMER (op cit) informa que foi a partir de 1971, com a Lei 5692/71, que a educação básica foi prolongada de 4 para 8 anos de duração, passando o ensino de 1º grau, dirigido as crianças de 7 a 14 anos, a ser obrigatório em todo o estado Nacional. Contudo, essa Lei não definiu nenhum termo para designar a educação da criança na faixa etária anterior, aos sete anos:
Art. 19- Os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam conveniente educação em escolas maternais, jardins-de-infância e instituições equivalentes.
A despeito disso, PINHEIRO (1998) relata que do ponto de vista legal, é a Lei 5692/71, o primeiro documento que normatiza a ação do poder público em relação à pré-escola. A partir de então, a educação infantil em creches e pré-escolas passou a ser, um dever do estado e um “direito” da criança.
Entretanto, SOUZA (1996) revela que, apesar dessa Lei (5692/71) ter apresentado esse artigo sobre a educação infantil, este se apresenta de maneira genérica, em nada contribuído para estimular sua expansão pelos organismos públicos, ficando sua prática restrita a algumas poucas escolas dos grandes centos urbanos do país.
De acordo com OLIVEIRA (op cit), em 1972 houve um aumento na demanda por pré-escola chegando a 460 mil matriculas em todo país. Dois anos depois (1974), o Ministério da educação e Cultura criou o serviço de Educação Pré-Escolar, e, em 1975 a Coordenadoria de Ensino Pré-Escolar.
E em 1977 é criado um programa de educação Pré-escolar de massa, intitulado Projeto Casulo o qual foi organizado em muitos brasileiros, com o objetivo de atender um número gigantesco de crianças. (id)
A partir da década de 80, o processo de democratização vivido no país impulsionou muitos debates acerca da educação infantil. Uma intensa mobilização pelos direitos da infância, envolvendo entidades especialistas, igrejas e diferentes organizações da sociedade civil provocando desdobramentos importantes que influenciaram na elaboração do novo texto constitucional. Além disso, muitos questionamentos foram feitos por técnicos e professores acerca dos programas de cunho compensatório. (HORN e FARENZENA, 2002).
Entretanto, GEIB (Ibid) comenta que foi somente, em 1981, que o Programa Nacional de Educação Pré-Escolar negou a função de compensação de carências e seu ensino preparatório de 1º grau. Mantendo, contudo, o princípio anterior. Essa foi a primeira manifestação oficial contra a educação compensatória. Tal proposta tentou incorporar algumas críticas feitas pelos teóricos sobre a educação compensatória, pois esta continha contradições e ambigüidades.
OLIVEIRA (2002), nos mostra que em 1985, novas políticas para as creches quando foram incluídas no plano Nacional de Desenvolvimento. Plano esse elaborado somente em 1986. começam a ser admitida a idéia de que a creche não dizia respeito apenas à mulher ou à família, mas também ao Estado e às empresas. Em função disso, retoma-se as discussões sobre as funções das creches e pré-escolas no país.
Em função disso, retoma-se a discussão das funções da creche e pré-escola e a elaboração de novas programações pedagógicas que buscavam romper com as concepções meramente assistencialista e/ou compensatória a cerca das instituições, propondo-lhes uma função pedagógica que enfatizasse o desenvolvimento lingüístico e cognitivo das crianças. (id).
Em 1988, o Brasil saiu na frente de todo mundo! Antes mesmo da Convenção sobre os Direitos da Criança ser aprovada pela ONU em 1989 e virar uma lei internacional.Surge a constituição de 1988, marco para a (re)definição das políticas públicas para a educação infantil. Pela primeira vez, a Constituição explicita a educação de zero a seis anos de idade, como sendo um dos deveres do Poder Público (Estado) para com a educação, definido claramente no art.. 208 incisos IV, quando diz que:
Art. 208 – O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
IV. atendimento em creche e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade.
A partir de então, a educação infantil em creches e pré-escolas passou a ser, ao menos do ponto de vista legal, um dever do estado e um direito da criança. Além disso, o art. 7, incisos XXV garante o direito dos trabalhadores, homens e mulheres à assistência gratuita aos seus filhos, dependente e de pré-escola. Vale ressaltar que foi essa constituição que definiu eminentemente a função educativa que a creche deveria assumir ao colocá-la no capítulo da educação.(HORN e FARENZENA, 2002).
Com essa Constituição ficou definido que os pais, a sociedade e o poder público têm de respeitar e garantir os direitos das crianças definido no artigo 227.
Em 1990, foi criado um conjunto de leis admirado em muitos países.Uma delas foi à promulgação do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), Lei 8.969/90 que determinou o atendimento em creches e pré-escolas como parte dos direitos da criança quando mecanismo de exigibilidade legal desse direito, promulgados pela Constituição de 1988. (id).
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 4º dispõem que é dever do Poder Público assegurar o direito das crianças e adolescentes à educação. O artigo 54 do ECA, inciso IV, expressa que é dever do Estado assegurar atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade. de acordo o ECA, o acesso à criança na educação infantil é universal não havendo obrigatoriedade dos pais em colocá-los na escola até os seis anos de idade. O ECA foi um grande avanço. Surge, portanto, um novo marco na educação infantil. (CRAIDY, 2001)
Apesar do Estatuto criar condições de verdade para que o governo e a sociedade trabalhem juntos por uma infância melhor,os direitos da criança no Brasil são desrespeitados diariamente.
Contudo, CRAIDY (2001) registra que foi a LDB Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996, que “garantiu” o atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de três a seis anos de idade, considerando a educação infantil como a primeira etapa da educação básica, destacada nos artigos 29 e 30:
Art. 29- A educação infantil, primeira etapa da educação básica tem por finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.
Art. 30- A educação infantil será oferecida:
       I.            em creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;
    II.            em pré-escolas, para crianças de quatro a seis anos de idade.
A LDB reconhece nesses artigos a necessidade de uma proposta cujo objetivo seja claramente integrado a criança. Nela os direitos da criança, no que diz respeito à educação, assegurado tanto na Constituição federal, como no Estatuto da Criança e do Adolescente, transforma-se em diretrizes e normas que deverão que ser regulamentadas em uma série de procedimentos. É um grande avanço se analisarmos que a educação infantil não havia recebido nenhum destaque como estes nas legislações anteriores.
Pela primeira vez na história do nosso país, a educação infantil é considerada como a primeira etapa da educação básica. Uma conquista histórica que tira as crianças pequenas e pobres do seu confinamento em instituições vinculadas a órgãos de assistência social. A educação infantil, conquistou, portanto, um novo espaço social.
Para BARBOSA (2002), a LDB de 1996 procurou romper com esta divisão entre instituições educativas e de cuidado, criando novos modelos onde os dois aspectos: cuidado e educação estivessem unidos. Essas mudanças trouxeram consigo as responsabilidades de cuidar e educar para a área educacional,buscando atingir o objeto principal da Educação Infantil.
Nesse sentido, a educação infantil passou a constituir um segmento importante do processo educativo. Seu crescimento alcançou um significado social de maior relevância, como se pode constatar, analisando as políticas sociais voltadas para essa área de ensino. Esse reconhecimento traz, tanto para os municípios, quanto para as instituições, educadores e familiares, um aumento na responsabilidade na educação das crianças com menos de 7 anos.
Um ponto fundamental a destacar diante dessa nova configuração da educação infantil é sem dúvida, a formação docente. Conforme os artigos 67, 69 e 70 da nova LDB, diz-se que os profissionais que atuam em creches e pré-escolas que não possuem a escolaridade mínima exigida por lei possam concluí-la, em serviço, complementando a formação específica para o exercício profissional. Em médio prazo, todos os docentes da Educação Infantil devem ser formados em cursos de nível superior (licenciatura de graduação plena), admitida, como formação mínima. Em outras palavras, o professor de educação infantil, no contexto atual, precisa ter formação superior, de preferência em pedagogia.
Além disso, novas concepções acerca do desenvolvimento, da cognição e da linguagem modificaram a maneira como as propostas pedagógicas eram pensadas. Entre elas destaca-se o RCNEI (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil), formulado pelo MEC em 1998, com o intuito de apontar metas de qualidade que contribuam para que as crianças tenham um desenvolvimento integral de suas identidades, capazes de crescerem como cidadãos cujos direitos lhes são reconhecidos. O documento também serve de base para a elaboração de projetos pedagógicos.(OLIVEIRA, op cit).
Em 1999, o Conselho Nacional da Educação, institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação. Iniciativa pioneira no cenário educacional brasileiro. De acordo com a Resolução I de sete de março de 1999, em seu artigo 2º, essas diretrizes constituem doutrinas sobre princípios, fundamentos e procedimentos da educação básica do Conselho Nacional de Educação Infantil e dos Sistemas Brasileiros de Ensino, na organização, articulação, desenvolvimento e avaliação de suas propostas pedagógicas. (DIAS E FARIAS, 2001)
Mas, apesar das conquistas, PINHEIRO (Ibid) comenta que a situação atual da Pré-escola, no Brasil, ainda merece atenção, uma vez que a criança brasileira, menor de 7 anos, na sua maioria, está fora da Pré-escola, pois, apesar da difusão dos pressupostos teóricos, quanto à importância da proposta educativa voltada à criança, a instituição escolar ainda é marcada pelas funções custódias e compensatórias.
OLIVEIRA (Id) ainda acrescenta que esses pontos, contudo, estão longe de representar uma transformação das práticas didáticas nas creches e pré-escolas. Uma nova trajetória orientada para a formação e aperfeiçoamento dos educadores se apresenta para ser coletivamente trilhada.
Nesse contexto, CARVALHO (1988) informa que a educação infantil tem sido relegada ao abandono em termos de uma política educacional, cuja evidência está na falta de uma orientação pedagógica, na inadequada formação dos profissionais que atuam nessa área, nas precárias instalações e, ainda, na controvérsia sobre o que seja alfabetizar na educação infantil.
2.2. Definindo conceitos.
ao longo do retrospecto histórico da educação infantil no Brasil, percebe-se que essa passou por várias definições desde seu surgimento, por essa razão considera-se necessário discutir os termos creche, pré-escola e educação infantil.
KRAMER (apud SOUZA, 1996), distingue creche de pré-escola quando diz que: “Defini-se creche por incluir crianças de zero a três anos, já a pré-escola por incluir crianças de quatro a seis anos. Enquanto, a creche se caracteriza por uma atuação diária em horário integral, a pré-escola funciona em “meio período”, semelhante ao funcionamento da escola”.
A autora ainda acrescenta que “a creche se subordina aos órgãos de caráter médico ou assistencial e a Pré-escola ao sistema educacional”.
CAMPOS et al (apud SOUZA, 1996) traz a seguinte definição para os termos creche e pré-escola:
“Creche é denominada para toda instituição, com o objetivo de educação, guarda e assistência, que atende crianças de 0 a 03 anos e 11 meses”.
“A denominação pré-escola é usada para toda instituição, com os mesmos objetivos da creche, porém atendem a crianças na faixa etária de 04 a 06 anos e 11 meses”.
Esses dois termos foram, por muito tempo, usados para designar a educação da criança de 0 a 6 anos. Contudo, em 1993, o Ministério da Educação e do Desporto preocupado com o compromisso de acompanhar os acontecimentos ocorridos na educação, voltada à criança com idade inferior a 7 anos, propôs mudanças na política nacional de educação. Em face disso, surge o termo educação infantil cujo, significado é assim explicitado:
“A Educação Infantil é a primeira etapa da Educação Básica, destinada à criança de zero a seis anos de idade; as instituições que oferecem Educação Infantil integrante dos sistemas de Ensino, incluindo as creches e pré-escola, dividindo-se a clientela entre ele pelo critério exclusivo da faixa etária de zero a três anos na creche e de quatro a seis anos na pré-escola”.
CAPÍTULO III
CONCEPÇÕES DE CRIANÇA ESTABELECIDAS PELOS EDUCADORES
DA EDUCAÇÃO INFANTIL DA ESCOLA MATEUS VIANA.
Este capítulo constitui o núcleo da pesquisa. Nele será focalizada a escola alvo deste estudo, bem como, a concepção dos educadores de educação infantil da escola Municipal Professor Mateus Viana, em Caicó/RN, acerca do ser criança, tendo como pano de fundo as idéias de KRAMER e LEITE, 1991; RECNEI, 1998; OLIVEIRA, 1994; et al.
A criança, no contexto atual, em ganhado cada vez mais espaço no cenário social, familiar e escolar. Contudo, observa-se que existem educadores que não têm consciência do seu papel na sociedade e porque não dizer na sala de aula..
É com essa preocupação que surgiu a necessidade de investigar o conhecimento dos educadores a respeito da criança em seus múltiplos aspectos, ou seja, o que pensam e como a concebem na atualidade. Além disso, pretende-se fazer uma analogia das teorias existentes com a prática cotidiana dos docentes.
Nesse sentido, o estudo foi realizado com 06 educadoras, sendo 04 professoras do ensino infantil, a diretora e a supervisora da escola ora citada. Procurou-se, no presente estudo, fazer uma pesquisa qualitativa com pressupostos teóricos metodológicos permitindo interpretar os dados coletados. MINAYO (1997), analisa a pesquisa qualitativa como “um espaço mais profundo das relações dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.”
Para fazer uma descrição mais apurada do objeto de estudo, utilizou-se como técnica de pesquisa o questionário, contendo 5 questões abertas (subjetivas), quando foram aplicados no próprio local de trabalho e respondidos anominamente, respeitando a individualidade dos investigados. Esta foi desenvolvida de janeiro a outubro de 2002.
Ao tentar compreender as falas dos educadores apresentadas nesse estudo, buscou-se fundamentação teórica na pesquisa bibliográfica. A tônica desta pesquisa gira em torno da hipótese de que conhecendo as concepções de criança poder-se-á levar os professores a trilhares novos caminhos em busca de uma prática pedagógica satisfatória.
3.1 Contextualização da Escola
Contextualizar a escola significa contar um pouco de sua história, de sua gente e de sua comunidade escolar a qual se constitui o marco principal, onde se deu a realização da pesquisa. Pretende-se, com isso, conhecer a realidade da instituição e dos sujeitos sociais que as compõem e constroem a sua base de sustentação histórica, econômica e social.
A Escola Municipal Professor Mateus Viana, situada à rua José Maria Gonçalves Vale, 175, Bairro João XXIII, Caicó/RN, escolhida como cenário de investigação e fonte de pesquisa será contextualizada levando em consideração os seguintes aspectos: infra-estrutura e situação sócio-econômica e cultural na qual está inserida.
As origens da escola datam de 18 de setembro de 1996, ano que foi inaugurada. Criada através do decreto 0001/81 – (1981), na gestão administrativa do Prefeito Inácio Bezerra de Araújo, para atender às necessidades da clientela escolarizável da comunidade. Iniciaram-se suas atividades com um número de 27 alunos na 1ª série do primeiro grau.
Fazia parte do corpo docente na época, 04 professores que durante três anos enfrentaram sozinhos todo o trabalho escolar. Atualmente, sua área física consta de 1.340m.
Sendo uma instituição de pequeno porte, tem uma estrutura física composta de 06 salas de aula, 01 secretaria onde funciona a direção da escola, 01 cozinha, 03 banheiros, 01 pequeno pátio com a metade da área coberta a qual chama-se refeitório, onde as crianças merendam. Não existe sala de vídeo, porém a televisão é ambulante, indo a sala de aula conduzida por uma educadora que trabalha com a TV escola, de acordo com as necessidades dos alunos e professores.
A escola atende uma clientela de 412 alunos distribuídos em três (03) turnos, sendo 109 alunos do Ensino Infantil: “Pré-Escola”, Jardim II e Alfabetização (turno matutino) e 254 no Ensino Fundamental, de 1ª a 4ª série (matutino e vespertino) e 49 na Educação de Jovens e Adultos (noturno).
Tendo em vista que a área específica da pesquisa é a “Pré-Escola”, verificou-se que as turmas estão distribuídas da seguinte forma: Alfabetização “A” 26 alunos; Alfabetização “B” 19 alunos todos com idade de 05 a 06 anos. E o jardim II com 64 alunos matriculados com a idade variando entre 03 e 04 anos de idade. Faz-se necessário frisar que as crianças do jardim II freqüentam a aula todos numa mesma sala, com a presença de três (03) professores para cuidar e educar as crianças.
No que se remete à formação ou grau de escolaridade dos professores da “Pré-Escola” este apresenta a seguinte realidade: dois (02) professores são leigos; um (01) tem o magistério; um (01) tem formação em pedagogia, e outro em geografia. No setor administrativo a formação é a seguinte: a diretora é formada em geografia, já a vice-diretora é supervisora, tem pedagogia.
As crianças do Ensino Infantil são, em sua maioria, oriundas do bairro João XXIII, onde fica localizada a escola, mas também, encontram-se alunos de bairros circunvizinhos.
Esses alunos são filhos de mães e pais carentes, de famílias de baixa renda onde sua maioria sofre com o desemprego, e a exclusão social. Já os que trabalham, exercem as seguintes profissões: bordadeira, doméstica, costureira, ASG, lavadeira de roupa, pasteleira, agricultor, servente de pedreiro, artesão, pintor, mecânico, sapateiro, boneleiro, pescador, motoqueiro. Porém, essas profissões não garantem renda fixa, uma vez que grande parte destes,em determinada época, fica desempregada ou vive de pequenos biscates com renda inferior a um salário mínimo ou apenas um salário.
De acordo com os dados coletados nas (fichas individuais dos alunos), verificou-se o nível de escolaridade dos pais das crianças da educação infantil. Na sua minoria chega ao 2º grau completo, enquanto que a maioria das mães e pais pesquisados têm o primeiro grau incompleto referentes às categorias de 2ª, 3ª e 4ª série e de 5ª a 8ª série. Portanto, os demais que estão em nível de 1ª série e alfabetização, são analfabetos.
Pode-se perceber que os alunos estão inseridos em uma cultura popular que lhe é peculiar do modo de viver de suas famílias e da comunidade a qual eles pertencem, do contexto social e histórico, herdado de seus antepassados. As crianças participam de festas folclóricas, quadrilha, dança e brincadeiras.
Em seu quadro funcional, a escola conta com 22 funcionários e 16 professores para atender a sua clientela,
3.2. Concepções de criança na visão dos educadores: apresentação e análise dos dados.
Busca-se aqui extrair dos educadores (professores, diretora e supervisora), a concepção que estes detém, acerca do ser criança. É neste nível de investigação, portanto, que se procura desvelar o sentido de criança na visão dos profissionais da educação infantil. Dessa forma, o presente estudo tem como preocupação primordial conhecer a opinião dos educadores nos seguintes aspectos.
A análise dos dados coletados a partir da fala dos educadores da Escola Mateus Viana acerca da concepção da criança nos mostra que a maioria dos investigados tem uma visão abstrata de infância/criança. Estes as concebem como seres de natureza infantil, onde a criança é vista como um ser inocente e frágil. Como se pode ver na fala destes:
“A criança é um ser inocente que merece carinho, afeto e compreensão” (Professora 1).
“Tenho um pouco de conhecimento mas para fazer um bom trabalho precisa-se de muito mais”. (Professora 2).
“A criança é um ser social” que está diretamente ligado ao meio em que vive para se desenvolver saudavelmente (Professora 3).
“Uma pessoa que está aberta a adquirir novos conhecimentos e que para isso precisa de orientações. Mas que também precisa de lazer e de uma boa estrutura familiar” (Professora 4).
Com base nesses relatos, verifica-se que uma pequena parcela, ou melhor, apenas uma professora (3), tem uma concepção diferente das demais, quando diz que a criança é um ser social, enquanto sujeito que age, interage e modifica a sociedade. Mas, apesar dessa professora apresentar uma visão mais próxima da concepção defendida atualmente por alguns teóricos, de que a criança é um ser social…tal visão esta é incompleta, pois não deixa explícita a classe social a qual, acriança pertence, bem como a cultura a qual está inserida, como postula o RECNEI para a educação infantil.
Contudo, sua visão assemelha-se a de KRAMER (1991) quando aponta a criança como um ser social, histórico, não mais percebida apenas como sujeito em crescimento, em processo. Assim ela cita:
Ela é alguém, em sua casa, na rua, no trabalho, no clube, na igreja, na creche, na pré-escola ou na escola, construindo-se a partir das relações que estabelece em cada uma dessas instâncias ou em todas elas. Geradas por homem e mulheres que pertencem a classes sociais, tem e produzem cultura, vinculam-se a uma dada religião, possuem laços étnicos e perspectiva diversas segundo seu sexo: as crianças já nascem com uma história. Assim, elas fazem e se fazem na cultura, pertencem a uma classe social, e vão se fazendo nessa história, cidadãos de pouca idade que são, muito mais do que exemplos de fases de uma escala de desenvolvimento.
É importante ressaltar que ainda existe, entre os educadores com uma visão “conservadora” a respeito da criança, como é o caso da professora 1, que concebe a criança como ser inocente, frágil. Concepção esta apresentada por ARIÈS (1978), no século XVII. Vale frisar também que duas educadoras não responderam a questão, isso nos leva a crer que essas não têm conhecimento do conceito de criança, no contexto atual, do contrário, a questão não ficou clara para elas.
A despeito disso, procurou-se investigar, também, o depoimento da diretora e da supervisora escolar, quando citam que:
“A criança é um ser natural que pensa, ela sente, cria idéias, tem opiniões. A criança cria um mundo de fantasia” (diretora da escola).
“A criança é um ser social histórico que faz parte da organização familiar, com direitos e deveres. É um pouco de tudo ou seja, ela é criativa, espontânea, questionadora e que sempre encontra soluções para os problemas, é preciso apenas encaminhá-la e lhe dar chances”. (Supervisora).
Percebe-se uma discrepância em seus pontos de vista. Enquanto a diretora acha a criança um ser natural, fantasioso e pensante. A supervisora a concebe como um ser que age, interage e modifica a sociedade.
O pensamento da supervisora, portanto, está de acordo com o RECNEI (1998) quando informa que: “A criança como todo ser humano, é um sujeito social e histórico e faz parte de uma organização familiar que está inserida em uma sociedade, com determinada cultura em um determinado momento histórico. É profundamente marcada pelo meio social em que se desenvolve, mas também o marca”.
Já concepção da diretora está em conformidade com o pensamento de PIAGET (apud, OLIVEIRA 1994), quando destaca que “o organismo e o meio exercem ações recíprocas. Um influencia o outro e essa interação acarreta mudanças sobre o indivíduo. “Ele diz: É, pois na interação da criança com o mundo físico e social que as características e peculiaridades desse mundo vão sendo conhecidas. Para cada criança, a construção desse conhecimento exige elaboração, ou seja, uma ação sobre o mundo”.
No que diz respeito ao papel da criança, objeto de trabalho em sala de aula, as professoras pesquisadas demonstraram não entendimento da pergunta, pois apenas 1 deixa explicito que “o papel da criança é, antes de tudo, o de aprender e que esta aprendizagem se dar na interação com os professores e colegas”. Veja os depoimentos:
“Como uma pessoa dotada de inteligência, capaz de aprender e por em prática, os ensinamentos adquiridos” (Professora 1).
“A criança de hoje é melhor de se trabalhar, pois elas são mais ativas e muito criativas” (Professora 2).
“O papel da criança em sala de aula é antes de tudo o de aprender. Essa aprendizagem não se dar só entre professor e aluno, mas também na interação como os outros colegas” (Professora 3).
“Um ser muito ativo e difícil de se trabalhar, principalmente se essa criança não estiver alfabetizada” (Professora 4).
Com base nos depoimentos, pode-se disser que apesar da “preocupação” das educadoras com aprendizagem das crianças, a maioria não responderam a questão, com exceção da professora 3 que denota conhecimento a cerca do papel da criança.
A concepção desta professora assemelha-se ao pensamento de VYGOTSK (apud OLIVEIRA, 1994) quando revela que “a construção do conhecimento está disponível na sociedade em que a criança nasceu. Ele afirma: É preciso que a criança aprenda e integre em sua maneira de pensar o conhecimento da sua cultura”.
Nessa ótica, MACHADO (2000) informa que: “é na interação social que a criança entrará em contato e utilizará instrumentos mediadores, desde a mais tenra idade. a necessidade e o desejo de decifrar o universo de significados que a cerca leva acriança a coordenar idéias e ações a fim de solucionar os problemas que se apresentam”.
É importante ressaltar a visão da diretora sobre o papel criança, enquanto objeto de trabalho:
“Assume um papel importantíssimo pois toda atividade desenvolvida em sala de aula é planejada para o aluno, ele é a peça fundamental na sala de aula”. (diretora da escola).
Por conseguinte a da supervisora:
“Na sala de aula a criança é sujeito principal. Todos os direcionamentos são dirigidos ao seu crescimento pessoal e intelectual” (Supervisora).
A visão da diretora é semelhante a da supervisora, quando afirmam que a criança é a peça principal na sala de aula. contudo. estas não explicitam que papel a criança desempenha na sala de aula, se é de mero expectador, ou de um sujeito que participa e interagem com colegas professores, ou seja, um ser em constante transformação, pois como cita OLIVEIRA (2002) “a criança, na interação com parceiros diversos, busca construir sua identidade dentro de um clima de segurança, exploração e autonomia. Não é mera receptora elaborada pela sociedade de consumo, mas alguém que se pergunta sobre o mundo”,
No que se remete ao tipo de comportamento que valorizam no desenvolvimento da criança, as professoras indagadas respondem:
“A criança é influenciada pela sociedade, pelos meios de comunicação e, principalmente pelo convívio familiar”. (Professora 1)
“Conhecer e respeitar os limites de cada um, propor atividades que faça os mesmos sempre avançar”. (Professora 2).
“Atitudes de participação na aula com interferência para perguntar algo sobre outro assunto que auxiliam na sua formação” (Professora 3)
Cabe fazer aqui algumas considerações a respeito da fala dos professores, pois estas não deixam explicito o que valorizam no desenvolvimento da criança, deixando obscura a atitude dos alunos. Com exceção de uma professora que considera a participação do aluno em sala de aula como uma atitude positiva na construção do conhecimento.
Entretanto OLIVEIRA (2002) revela que “em geral, os comportamentos dos estudantes são avaliados como adequados ou inadequados a partir da lógica adulta, cabendo ao professor recompensar a conduta “certa” e punir a “errada”. Prevalece, na escola a crença de que “é de pequenino que se torce o pepino”.
Quando se perguntou a diretora e a supervisora da escola sobre o tipo de comportamento que valorizam no desenvolvimento da criança, Constatou-se que as mesmas têm pontos de vistas diferentes:
“A integração é fundamental para se constatar como a criança aprende a socializar e a descobrir sua própria identidade” (diretora).
“O comportamento afetivo, emocional e ético que favorecerão o crescimento interpessoal e socializador do adulto futuro” (supervisora).
É interessante, observar que a diretora fala da importância da integração que pode ser considerado como uma atitude positiva. Contudo, esquece de mencionar com quem essa integração desse acontecer? Com o professor? Com os colegas? Ou seria professor e aluno e aluno e aluno?. Além disso, ela deixou de comentar que comportamento considera relevante para a formação do indivíduo. Por outro lado, a supervisora cita como importante o comportamento e esquece de comenta sobre as atitudes.
Indagadas a responderem sobre em que contexto a criança está inserida na educação infantil, as professoras fizeram as seguintes declarações:
“No desenvolvimento, cognitivo, afetivo e social” (professora 1).
“Na educação infantil precisa de muitas coisas” (professora 2)
“A educação infantil parece ser uma válvula de escape das escolas para atender a normas burocráticas do MEC. Percebe-se pelo discurso dispensado a essa categoria. É como se o objetivo desse ensino não fosse o desenvolvimento da criança e sim alimentar essas crianças, hipocritamente os professores dizerem que ensinam. Não acredito que sem um ambiente próprio com um número específico e com profissionais qualificados essas crianças aprendam o suficiente para desenvolver de acordo com sua fase. Hoje o ensino infantil é mais “despensa” de meninos e restaurante infantil, que aqui não posso chamar de creche pois não possue (sic) estrutura física para a mesma”. (professora 3)
“Especificamente na sala em que trabalho, algumas crianças não recebem apoio familiar para a orientação do trabalho escolar valorizado em casa. Algumas reclamam da falta de estrutura familiar, como: pais separados ou mesmo pelo fato de algumas crianças terem irmãos, cada um de um pai diferente. Mas há também aquelas crianças cujos pais freqüentam a escola para saber como anda sua aprendizagem” (professora 4).
Mais uma vez as professoras em sua maioria demonstraram não ter conhecimento sobre a educação das crianças de zero a seis anos, é essa a impressão que se tem, pois apenas a resposta de educadora 1, se aproximou do que postulam os Referenciais Curriculares para a educação infantil. Essa discrepância de pontos de vistas, ou melhor, esse “desconhecimento do assunto” é resultado da falta de um espaço para discussões, estudos e trocas de experiência. A fala das professoras demonstra que falta leitura, discussões, na escola (poder ser até que a escola se preocupe em promover debates e estudos na escola, mas o que ficou explicito diante dos depoimentos das professoras é que não há).
Como se pode observar, a professora 1 foi a que mais demonstrou conhecimento do assunto, quando enfatiza que a criança está inserida em um contexto social, contudo esta esqueceu de acrescenta que a criança também se insere no contexto cultural, histórico, pois acriança faz parte da sociedade, portanto está inserida em todos os contextos.
De acordo com BUJES (2001), “as crianças na educação infantil, estão inseridas em um contexto cultural e histórico em permanente transformação, podemos concluir que as crianças participam igualmente desta transformação pelas experiências que vivem neste mundo extremamente dinâmico”.
Contudo, é importante destacar que apesar das demais professoras investigadas, não terem comentado sobre as atitudes e comportamentos que consideram importantes, estas relatam dados relevantes como é o caso das professoras 3 e 4, quando citam a situação na qual se encontra a educação infantil na instituição que trabalham, pois através de visitas e conversas informas, detectou-se que na escola alvo deste estudo, existe uma sala de aula com cerca de 54 crianças em idade pré-escola freqüentando, regulamente a escola (foram matriculados 64). Um verdadeiro absurdo, se compara com o que postula o RCNEI (1998), quando enfatiza que cada sala de aula deve ser composta por 25 alunos. Assim, ele cita:
Tão importante quanto pesar nos agrupamento por faixa etária é refletir sobe o número de crianças por grupos e a propagação de adultos por criança. Quanto menores as crianças, mais aconselhável são os grupos muito grandes, pois há uma demanda de atendimento individualizado. (….) Quando as crianças adquirem maior autonomia em relação aos cuidados e interagem de forma mais independente com seus pares, entre 3 e 6 anos, é possível pensar em grupos maiores, mas que não ultrapassem 25 crianças por professor.[grifo nosso].
O depoimento da diretora e da supervisora, difere das professoras, quando relatam que:
“Está inserida no sistema educacional e social pois é na escola onde a criança inicia uma socialização com outro, desenvolvendo os limites de seu corpo e seu potencial crítico”. (diretora).
“Em contexto de interação social e cultural que proporcionam a criança, o contato com as mais diversas linguagens, ampliando seu conhecimento, seus conhecimentos prévios”. (supervisora).
A diretora e a supervisora denotam ter “conhecimento” sobre o contexto no qual está inserida a criança na educação infantil atualmente. Entretanto faz-se necessário destacar que não é somente na escola que a criança se socializa, como diz a diretora, mas na interação como o meio em que vive, seja na escola, em casa, na rua.
Por outro lado, a visão da supervisora, está em comum acordo com o que diz o RCNEI (1998), quando enfatiza que “a criança como todo ser humano, é um sujeito social e histórico e faz parte de uma organização familiar que está inserida numa sociedade com uma determinada cultura, em um determinado momento histórico”.
Ao questionar as professoras sobre as características das crianças com as quais trabalham atualmente, estas foram categóricas ao responder que:
“Como uma criança capaz de criar, refletir e construir o próprio raciocino” (professora 1)
“As crianças são boas para trabalhar, com algumas dificuldades, tem umas que são um pouco rebelde” (professora 2).
“São crianças que pelo convívio e pelo ambiente em que vivem assim como o tratamento recebido mas parece “adultos anões”. Adultos pois a maioria estão na idade de ter limite e são ilimitados, desprovidos de um menino de regras que garantam a boa convivência com o grupo. O nosso papel é deixar que na escola eles possam a ser (sic) criança com todas as glórias da infância”. (professora 3).
“Atualmente, algumas crianças não tem muito interesse em aprende. Acredito que boa parte delas, freqüenta a escola pela merenda oferecida. Pois a brincadeira é constante em sala de aula. no presente, essa situação não interfere em sua vida, mas no futuro isso se tornará um grande problema, pois o mercado de trabalho não está interessado em oferecer emprego a pessoas que não possuem qualificação” (professora 4).
De acordo com as falas apresentadas, pode-se concluir que apenas uma professora descrever a criança com a qual trabalha atualmente, quando diz que a criança é um ser capaz de criar, refletir e construir seu próprio raciocínio. A criança é isso e muito mais, a criança hoje é vista como um ser pensante, ativo, histórico.
Nesse contexto, OLIVEIRA (2002) revela: a criança hoje é vista como um ser ativo curioso, com direitos e necessidades que precisam de um espaço diferente tanto no ambiente familiar, onde os objetos do afeto (os adultos) em geral são muitos confusos, como no ambiente escolar.
As demais caracterizam a criança, como sendo um ser difícil de se trabalhar, sem tem limites, sem interesse de aprender, sem um futuro promissor (professora 4), enfim, as crianças na visão destas professoras são um problema.
É com visão, que mais uma vez OLIVEIRA (id) vem nos informar que: “as crianças são vistas como “problemas” pelo professor menos em virtude de julgamentos fundados em avaliações objetivamente orientadas e mais em conseqüência da dificuldade do meio pedagógico em geral para lidar com comportamentos que divirjam de um modelo ideal de infância. Ao estigmatizar a criança, pela sua maneira de tratá-la, o professor termina por obscurecer suas interações com ela.
Já a diretora e a supervisora da escola, tem uma visão positiva das crianças com as quais convivem, ou melhor, das crianças no contexto atual.
“São crianças inteligentes sendo que gradativamente vai construindo (sic) suas idéias, também são afetivas, podendo assim termos um relacionamento de amizade. São participativas nas atividades desenvolvidas na sala de aula que são concretizadas por suas apresentações nos eventos escolares.”(diretora da escola).
“É um ser altamente imperativo com ansiedade e desejos de aprender. E que precisa de pessoas habilitadas com conhecimentos especiais para medir o processo de transformação pessoal” (supervisora).
Os depoimentos acima nos fazem inferir que ambas denotam ter conhecimento das crianças com as quais convivem. A supervisora vai mais além, quando cita que essas crianças precisam de pessoas habilitadas com conhecimentos. Seu pensamento comunga com o da nova LBD, quando frisa que os professores de educação infantil devem ter formação em nível superior. A colocação da supervisora é muito pertinente, pois duas professoras que trabalha na com a educação infantil (da escola alvo da pesquisa) são leigas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nessa perspectiva de olhar de pesquisadora, ressalta-se a importância deste valioso trabalho monográfico, o qual nos possibilitou observar como funciona a escola Municipal Mateus Viana, objeto de estudo e fonte de investigação desta pesquisa, bem como a visão dos professores a cerca do ser criança.
A experiência que as crianças vivem na educação infantil é muito complexa, além do que se pode imaginar. Dentre as salas de aula destinadas ao ensino infantil, pode ser encontrada na instituição, alvo deste estudo, uma sala de aula (Jardim II) superlotada, com mais de 50 crianças freqüentando regulamente esse ambiente. Esta forma de agrupamento estar relacionada muito mais a uma forma de necessidade do trabalho do adulto do que as necessidades das crianças.
Esse fato contradiz o que reza o Referencial Curricular Para a Educação Infantil. Considera-se essa realidade como sendo um descaso para com a criança, diante do que prever a Lei de Diretrizes e Bases sobre os direitos da mesma. Essa situação reflete as precárias condições de vida a que são submetidas esses pequenos seres da classe menos favorecida. Sabe-se que os problemas enfrentados pela escola, repercutem na vida do aluno.
Essa falta de espaço físico provoca uma certa fragilidade no desenvolvimento de trabalhos acadêmicos direcionados às crianças. É como se a função da educação infantil fosse apenas a de “cuidar” e alimentar as crianças, pelo menos é dessa forma professoras investigadas a concebem.
No que se remete às concepções que as educadoras detêm sobre a criança, estas divergem muito de educadora para educadora. Acredita-se que isso se deva ao fato de que nem todas têm formação acadêmica (curso superior ou uma formação mínima), pois a formação das educadoras investigadas é bem variada, indo desde pedagogia/geografia à leiga. Mais uma vez, Constata-se que a LDB não se faz valer nesta instituição de ensino.
Com base nos dados que nos foram apresentados e das visitas à escola, observa-se que é necessário que ocorra uma mudança urgente nessa escola, a começar pela própria sala de aula onde está esse amontoado de crianças. Por conseguinte, é preciso, que ocorram cursos de formação de professores (formação profissional continuada), e mais ainda, que estes educadores revejam suas práticas, pois as crianças não podem ficar a mercê de professores sem a formação mínima exigida na Lei.
Em síntese é preciso que os educadores percebam que a escola é um lócus de informação, troca de experiências, conhecimento, e que seu papel é proporcionar um ensino satisfatório.
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QUESTIONÁRIO
SECRETÁRIO
1. NOME DA ESCOLA______________________________________________________________
1.1 ENDEREÇO:___________________________________________________________
MUNICÍPIO:__________________ESTADO_________________FONE:__________
2. NÍVEIS DE ENSINO:
( ) Ensino Infantil (Pré-escola)
( ) Ensino Fundamental (1ª a 4ª série)
( ) Educação de Jovens e Adultos (Supletivo)
3. Dados complementares da escola (dependência administrativa).
( ) Estadual ( ) Municipal ( ) Conveniada
4. Horário de funcionamento:
( ) Matutino ( ) Vespertino ( ) Noturno
5. Números de alunos e turmas:
Número de alunos por turno__________________________
Número de turmas por turno__________________________
Total geral de alunos________________________________
6. Equipe técnico-pedagógica-administrativa (número de integrantes).
Diretor ___________________ Vice-diretor__________________
Supervisor_________________ Coordenador_________________
7.Númerode professores que não possuem licenciatura plena:_______________________
8.Área específica da pesquisa:________________________________________________

QUESTIONÁRIO
PROFESSORES DE EDUCAÇÃO INFANTIL.
1.     Enquanto educadora, qual a sua concepção de criança?
2.     Como você analisa o papel da criança, enquanto objeto de seu trabalho em sala de aula?
3.     Que tipo de atitudes e comportamentos valoriza no desenvolvimento da criança?
4.     Na sua opinião, em que contexto está inserido, a criança, na educação infantil?
5.     Como você caracteriza a criança, a qual trabalha atualmente?
QUESTIONÁRIO
DIRETORA E SUPERVISORA
1. Qual a sua concepção de criança, enquanto educadora?
2. Como você analisa o papel da criança, enquanto objeto de trabalho?
3. Que tipo de atitudes e comportamentos valoriza no desenvolvimento da criança?
4. Na sua opinião, em que contexto está inserido, a criança, na educação infantil?
5. Como você caracteriza a criança, atualmente?
Iconografia. Conhecimento e descrição de imagens, gravuras, fotografias.  Representação pictórica estudada por Áries.
Dado colhido na secretaria da escola, conforme ficha de matricula.
Autor: Marluce

Fonte: https://pedagogiaaopedaletra.com/a-concepcao-de-crianca-na-otica-dos-educadores/

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