A EDUCAÇÃO COMO MERCADORIA E O BANCO MUNDIAL COMO MERCADOR
Pautado em uma
análise essencialmente política e econômica, o artigo O Banco Mundial e
a Educação: reflexões sobre o caso brasileiro (Vozes, 1995, p.
169-195), da pesquisadora, mestra em Educação, especialista em Políticas
Públicas e Gestão Educacional, doutora em Ciências da Educação e professora da
Universidade de Brasília, Marília Fonseca, traz à tona uma riquíssima discussão
acerca das propostas economicistas voltadas à educação.
Respaldando-se
teoricamente tanto em publicações veiculadas pelo Ministério da Educação (MEC),
quanto nos documentos de política setorial produzidos pelo Banco Mundial nos
anos de 1970, 1974, 1980 e 1990, a autora analisa as condições, propostas e
diretrizes outorgadas pelo Banco Mundial, em certa parceria estreita com o
Fundo Monetário Internacional (FMI), para a concessão de empréstimos aos países
em desenvolvimento, como é o caso do Brasil.
Percebe-se então, à
medida que essas proposições vão sendo esclarecidas no decorrer do texto, que
os países que se submetem às condições impostas pelo BIRD, para que o
financiamento dos seus projetos seja aprovado por tal Banco, perdem, em certo
grau, aquilo que podemos chamar de autonomia política e econômica. E isto ocorre
justamente porque as cláusulas contratuais do Banco Mundial são legisladas com
este outro intento, isto é, de permitir que os países-membros (onde 50% dos
votos são controlados por cinco países: Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha,
França e Japão) intervenham diretamente na economia política dos países cujo
crédito dos empréstimos foi concedido.
No que toca às
condições de financiamento voltadas à educação, cabe frisar dois tópicos que
não devem passar despercebidos: o primeiro é que, embora a política de crédito
do BIRD se autodenomine “cooperação”, esse mesmo financiamento se integra à
dívida externa do país para com as instituições bilaterais, multilaterais e,
principalmente, para com os bancos privados, haja vista que ele corresponde a
um empréstimo de tipo convencional, com todas as suas taxas de compromisso,
juros e demais encargos; o segundo é que, de acordo com os dados oficiais
divulgados pelo MEC, a participação nacional, no que concerne ao plano
financeiro, foi muito maior que a do próprio BIRD, a saber, na execução do
primeiro projeto (1971 - 1978) a participação nacional foi de 65,5%, enquanto o
Banco Mundial custeou apenas 34,5%, e é no segundo projeto (1984 - 1990) que se
constata, efetivamente, o quão pífia foi a participação do BIRD com relação à
concessão de créditos, representando apenas 22% versus os 78%
da participação nacional.
Outro ponto que deve
ser ressaltado é o que diz respeito às condições para que esses projetos venham
a ser aprovados, mais precisamente a cláusula que impõe necessariamente a
exportação de equipamentos técnicos de outros países, o que constata, por si
só, dois pontos de extrema relevância: o primeiro é que confirma aquilo que foi
dissertado a pouco, ou seja, a questão de como o BIRD interfere na autonomia
político-econômica dos países cujos empréstimos lhes são concedidos; o outro, e
o mais importante, é que, ao impor a livre liberdade comercial entre diferentes
territórios, pode-se evidenciar, claramente, o caráter neoliberal que há por
trás da proposta do Banco Mundial, o que, como se sabe, justifica a
privatização do ensino público e a tentativa de mercantilizar a educação como
um todo.
É válido ressaltar
que, além da problemática estrutural ligada a essa política econômica, a
própria conjuntura do país, na época, não fora positivamente favorável a esses
projetos educacionais, haja vista que o estudo da professora Marília Fonseca
aponta inúmeras dificuldades na execução dos mesmos, como, por exemplo, atrasos
na construção das instituições de ensino, metas aquém dos limites traçados e
desejados, evasão de alunos a até mesmo problemas na aquisição de materiais e
equipamentos, como foi dito anteriormente com relação à obrigatoriedade das
exportações.
Por fim, vale
sublinhar que, mesmo que a experiência desses projetos mostre que os mesmos não
beneficiaram efetivamente o setor educacional, algumas inovações relevantes
foram introduzidas a partir dos mesmos, como é o caso da criação de cursos de
curta duração de engenheiros de operação e a introdução do modelo escola-fazenda.
No entanto, isto não justifica necessariamente tal empreendimento milionário,
pelo contrário, os dados empíricos dos quais se dispõem mostram claramente que,
no âmbito da educação básica, os resultados práticos dos acordos com o BIRD não
legitimam os seus custos, muito menos a sua continuidade.
Referência:
FONSECA, M. “O Banco Mundial e a
educação: reflexões sobre o caso brasileiro”. In: GENTILLI, P.
(org.). Pedagogia da exclusão. Petrópolis: Vozes, p. 169-195, 1995.
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