AVALIAÇÃO
PSICOPEDAGÓGICA
EOCA - Entrevista
Operativa Centrada na Aprendizagem
A Entrevista Operativa
Centrada na Aprendizagem (EOCA) é um instrumento inspirado na psicologia social
de Pichon-Rivière, nos postulados da psicanálise e no método clínico da escola
de Genebra foi idealizado por Jorge Visca e é um instrumento de uso simples que
avalia em uma entrevista a aprendizagem. (BOSSA, 2007.p.46)
Uma forma de primeira
sessão diagnóstica é proposta por Jorge Visca (1987, p. 72) através da EOCA.
"Em todo momento, a intenção é permitir ao sujeito construir a entrevista
de maneira espontânea, porém dirigida de forma experimental. Interessa observar
seus conhecimentos, atitudes, destrezas, mecanismos de defesas, ansiedades,
áreas expressão da conduta, níveis de operatividade, mobilidade horizontal e
vertical etc”. (Weiss apud Visca, 2007, p. 57).
As propostas a serem
feitas na E.O.C.A, assim como o material a ser usado, vão variar de acordo com
a idade e a escolaridade do paciente. O material comumente usado para criança é
composto numa caixa a onde o paciente encontrará vários objetos, sendo alguns
deles relacionados à aprendizagem, tais como, cola, tesoura, papel sulfite
branco e colorido, papel crepom e seda, coleção, cola colorida, livros de
leituras, revistas para recorte e colagem e diversos outros materiais.
O objetivo da caixa é
dar ao paciente a oportunidade de explorá-la enquanto o psicopedagogo o
observa, nesse momento serão observados alguns aspectos da criança como: a sua
reação, organização, apropriação, imaginação, criatividade, preparação, regras
utilizadas, etc.
De um modo geral,
usam-se propostas do tipo: “Gostaria que você me mostrasse o que sabe fazer, o
que lhe ensinaram e o que você aprendeu”, “Esse material é para que você o use
como quiser”, “Você já me mostrou como lê e desenha, agora eu gostaria que você
me mostrasse outra coisa”.
Durante a realização da
sessão, é necessário observar três aspectos:
• A temática, que
envolverá o significado do conteúdo das atividades em seu aspecto manifesto e
late
• A dinâmica, que é
expressa através da postura corporal, gestos, tom de voz, modo de sentar, e
manipular os objetos etc.;
• O produto feito pelo
paciente, que será a escrita, o desenho, as contas, a leitura etc., permitindo
assim uma primeira avaliação do nível pedagógico.
A partir da análise
desses três aspectos, o autor propõe que se trace o primeiro sistema de
hipóteses para continuação do diagnóstico.
REFERÊCIA:
WEISS, Maria Lúcia
Lemme. Psicopedagogia Clínica – Uma visão diagnóstica dos problemas de
aprendizagem escolar. 13 ed. Ver. E aml: RJ Lamparina.2003.
Fonte:http://psicopedagogiaeducacao.blogspot.com/2009/09/entrevista-operativa-centrada-na.html
Autores: Eliane
Cawahisa; Geiva Calsa; Ivonilce Gallo; Luciana Lacanallo
Introdução
Em decorrência do baixo
desempenho dos alunos nas escolas, uma quantidade cada vez maior de crianças
tem chegado aos consultórios de psicopedagogia apresentando dificuldades de
aprendizagem em matemática. Tanto na atuação clínica psicopedagógica quanto na
atuação escolar faz-se necessário um atendimento especializado nesta área de
conhecimento.
O desempenho que os
alunos vêm demonstrando, sem dúvida, justifica o desenvolvimento de uma
metodologia de trabalho capaz de promover uma aprendizagem significativa dos
conceitos e procedimentos matemáticos, em particular, nas primeiras séries do
ensino fundamental. Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento de uma
aprendizagem significativa, este artigo visa apresentar uma experiência de uso
de jogos de regras na construção do conhecimento matemático.
Embora desenvolvida no
âmbito clínico psicopedagógico considera-se oportuna sua ampliação para o meio
escolar regular, desde que atendidos os princípios teóricos e os critérios
metodológicos de desenvolvimento da atividade. O jogo da velha e o bafo foram
os jogos convencionais escolhidos como instrumentos terapêuticos da experiência
aqui relatada.
Os Jogos sob um Enfoque
Psicopedagógico
A brincadeira e o jogo
constituem-se uma necessidade humana e, segundo Kishimoto (2000), interferem
diretamente no desenvolvimento da imaginação, da representação simbólica, da
cognição, dos sentimentos, do prazer, das relações, da convivência, da
criatividade, do movimento e da auto-imagem dos indivíduos. Muitos educadores
desvalorizam a brincadeira acreditando que o mais importante na escola é
aprender a ler e escrever.
Não levam em conta que
todo o desenvolvimento que a brincadeira traz para os indivíduos é
pré-requisito para a alfabetização. Vygotsky (1996) afirma que a brincadeira
simbólica e o jogo formam uma zona de desenvolvimento proximal que pode se
constituir o ponto de partida para aprendizagens formais.
Segundo Piaget (1975),
por meio do jogo a criança assimila o mundo para atender seus desejos e
fantasias. O jogo segue uma evolução que se inicia com os exercícios
funcionais, continua no desenvolvimento dos jogos simbólicos, evolui no sentido
dos jogos de construção para se aproximar, gradativamente, dos jogos de regras,
que dão origem à lógica operatória.
Segundo o autor, nos
jogos de regras existe algo mais que a simples diversão e interação, pois, eles
revelam uma lógica diferente da racional. Este tipo de jogo revela uma lógica
própria da subjetividade tão necessária para a estruturação da personalidade
humana quanto a lógica formal, advinda das estruturas cognitivas. Para
Gonçalves (1999), os jogos de regras podem ser considerados o coroamento das
transformações a que criança chega quando atinge a reversibilidade do
pensamento.
Ao tentar resolver os
problemas originados no desenvolvimento do jogo, o sujeito cria estratégias e
as avalia em função dos resultados obtidos e das metas a alcançar na atividade.
Os fracassos decorrentes destas ações originam conflitos ou contradições por
parte do indivíduo e desencadeiam mecanismos de equilibração cognitiva
(Brenelli, 1996).
As regulações ativas
geradas por este processo implicam decisões deliberadas dos indivíduos que
originam novos procedimentos de jogo. Apresentam um caráter construtivo e por
meio delas a retomada de uma ação é sempre modificada pelos resultados da ação
anterior em um processo contínuo de modificação das ações seguintes, em função
dos resultados das ações precedentes (MACEDO, 1994).
Brenelli (1996)
assinala que conhecer os meios empregados para alcançar o objetivo do jogo, bem
como conhecer as razões desta escolha ou de sua modificação, implica uma
reconstrução no plano da representação do que era dominado pelo sujeito como
ação.
O processo de tomada de
consciência pode ser favorecido, dessa maneira, pela verbalização dos
procedimentos de jogo. Sob uma ótica construtivista a verbalização envolve
explicações sobre o que, como e porque os sujeitos executaram seus
procedimentos. A utilização da fala organizada é capaz de favorecer a
compreensão dos conceitos e procedimentos contidos nas situaçõesproblema
enfrentadas pelos sujeitos.
Em uma intervenção de
caráter psicopedagógico, o educador deve equilibrar uma atuação mais e menos
diretiva, conforme o tipo de tarefa a ser realizada pelos sujeitos. Nas tarefas
verbais sua atuação pode ser mais diretiva, pois, tem como objetivo organizar a
situação de aprendizagem e solicitar a re-interpretação das ações e das falas
dos sujeitos; nas tarefas práticas pode ser menos diretiva, pois, seu objetivo
é o de apenas orientar a ação a ser efetivamente realizada pelo sujeito (CALSA,
2002).
Do ponto de vista
psicopedagógico, o processo de aprendizagem envolve não somente a fala do
sujeito que aprende, mas também a fala de quem ensina. Ao “pensar em voz alta”
suas estratégias de ação o educador atua como modelo de reflexão para o
sujeito. Utilizados tradicionalmente como recursos clínicos (VISCA, 1987), a
fala organizada e o uso do modelo têm obtido na escola resultados satisfatórios
no ensino de diferentes áreas de conhecimento (SOLÉ, 1998; ZUNINO, 1995; CALSA,
2002).
A utilização do jogo de
regras como um recurso terapêutico ou escolar, seja por parte do psicopedagogo
ou do educador, exige conhecimento de sua estrutura e clareza dos objetivos a
serem atingidos. Macedo (1997) lembra que ao se propor um jogo é preciso ter em
mente o porquê de jogar, o que jogar, para quem, com que recursos, de que modo
jogar, quando e durante quanto tempo jogar, e qual a continuidade desta
atividade ao final de seu desenvolvimento.
Desenvolvimento das
Intervenções Psicopedagógicas
Foram escolhidos como
sujeitos da intervenção duas crianças que procuraram atendimento clínico
psicopedagógico com dificuldades de aprendizagem na área de matemática.
As crianças
freqüentavam a 3a. e 4a. série do ensino fundamental e apresentavam uma faixa
etária entre 9 e 11 anos de idade. Os dados obtidos nas sessões de atendimento
psicopedagógico foram registrados por escrito pelos terapeutas Elaboraram-se os
registros após cada sessão em que os jogos de regras foram utilizados. As
sessões foram realizadas individualmente com duração de 50 minutos cada uma. A
quantidade de sessões e sua periodicidade foram determinadas pelo interesse dos
sujeitos no desenvolvimento dos jogos.
Durante o jogo se um
jogador não conseguisse virar todas as fichas ou deixasse uma ou mais, a vez
seria do próximo participante. Se o jogador não possuísse a soma determinada
pelo seu adversário para fazer a aposta, o valor que não possuído seria
descontado da sua soma de pontos (os resultados parciais devem ser anotados).
Se um dos jogadores
possuísse uma única carta com o valor superior à aposta feita pelo adversário,
ele poderia tentar trocá-la por fichas que representassem essa quantidade. Caso
um dos jogadores não tivesse mais o valor para cobrir à aposta determinada pelo
adversário ele ficaria com saldo negativo que deveria ser pago no próximo jogo
(o registro do saldo negativo foi feito com anotações convencionais, por
exemplo - 4 pontos). Seria considerado vencedor quem conseguisse a maior soma
no final da partida.
Durante o processo de
intervenção psicopedagógica os jogos de regras foram desenvolvidos
respeitando-se sua natureza (estrutura interna), seus aspectos cognitivos,
afetivos e sociais. Num primeiro momento, optouse pelo ensino e desenvolvimento
do jogo, conforme seus materiais e regras convencionais. Após esta aprendizagem
novos elementos (numerais e operações) e regras foram introduzidos de acordo
com as dificuldades de aprendizagem de matemática a serem atendidas em cada
caso.
Resultados
Para a apresentação do
jogo do bafo optou-se pelo relato do caso clínico de J. P. (denominação
fictícia). As queixas da escola e da família quanto ao seu desempenho se
concentravam nos seguintes aspectos: não realizava cálculos mentais;
demonstrava possuir recursos intelectuais para realizar as tarefas de
matemática, mas não os utilizava; realizava tarefas escolares, sem contudo
dispor-se a refazê-las, no caso de estarem incorretas. Para facilitar o
acompanhamento das condutas de J. P. optou-se por dividir suas respostas em
etapas que permitem a percepção de seu crescimento tanto em relação às
estratégias de resolução quanto aos conteúdos de matemática propriamente ditos.
Os relatos dos jogos do bafo e da velha iniciam-se a partir da introdução de
novos elementos e regras à sua estrutura convencional para o atendimento das dificuldades
específicas de cada um dos sujeitos em foco.
Na fase inicial de
desenvolvimento do jogo do bafo já com a introdução de conteúdos matemáticos J.
P. se preocupava apenas em virar as figuras o mais precisamente possível sem se
importar com a soma dos numerais presentes em cada uma das fichas. Ele parecia
estar associando as fichas que utilizava neste jogo com as do jogo
convencional, em que o valor de cada ficha era definido pela força de seu
personagem. Ao poupar as fichas de maior valor - superiores a seis -
demonstrava preocupação com a quantidade de cartas de que dispunha no jogo.
Jogava o bafo seguindo os procedimentos do jogo convencional sem se dar conta
das novas estratégias originadas da introdução de numerais nas fichas.
Em um segundo momento,
J. P. começou a perceber que podia superar a terapeuta na sua agilidade de
virar as fichas, mas ainda assim não era capaz de ganhar o jogo. Enquanto
apostava fichas de valor baixo (1e2) a terapeuta apostava fichas de valor maior
que as absorviam. Suas apostas baixas permitiam à terapeuta ganhar o jogo
virando as fichas de maior valor em que havia apostado. Nesta etapa a soma de
pontos de J. P. era sempre menor que a da terapeuta embora possuísse uma maior
quantidade de fichas que ela.
O terceiro momento do
jogo do bafo caracterizou-se pela percepção de J. P. de que a soma dos pontos
de suas fichas o estava impedindo de ganhar o jogo. Começou então a jogar
tentando alcançar a maior soma de pontos em cada virada. Para tanto, passou a
apostar com suas fichas de maior valor. A cada partida examinava as fichas que
possuía, verificava as que havia perdido e organizava uma estratégia capaz de
promover o saldo negativo para a terapeuta.
No quarto e último
momento de sua evolução no jogo J. P. passou a apostar o maior número de fichas
possível e, de preferência, as de maior valor. Tornou-se capaz de levar em
conta em sua estratégia de jogo as duas variáveis ao mesmo tempo: quantidade de
fichas e valor de cada ficha apostada. A partir deste momento, preocupa-se em ganhar
o máximo de fichas e, ao mesmo tempo, atingir a maior soma possível de pontos.
Para o desenvolvimento
do jogo da velha escolheu-se o caso clínico de F. P. (denominação fictícia). A
queixa escolar e familiar de seu desempenho concentrava-se nos seguintes
pontos: não compreendia o significado dos sinais das quatro operações básicas;
não se mostrava capaz de utilizar e compreender os algoritmos convencionais de
adição e subtração; encontrava-se na fase inicial de construção do esquema
multiplicativo e parecia ainda não ter avançado na construção do esquema
aditivo; ainda utilizava algoritmos intuitivos e representação icônica tanto na
adição quanto na subtração.
Da mesma forma que no
caso anterior, o relato das estratégias envolvidas no jogo da velha se inicia a
partir da introdução de elementos e regras relacionadas ao conteúdo matemático
no qual o sujeito apresentava dificuldades de aprendizagem. Após esta
aprendizagem novos materiais (algarismos) e regras foram introduzidos de acordo
com as dificuldades de aprendizagem a serem atendidas no transcorrer do
tratamento.
No primeiro momento de
atuação com o jogo da velha F. P. mostrou levar em conta apenas os atributos
espaciais do tabuleiro sem se ater ao outro atributo, indispensável para a
vitória - a soma dos algarismos.
Durante esta fase
fixava-se apenas uma das dimensões espaciais do jogo: a diagonal. Utilizava
sempre a mesma seqüência de colocação de suas fichas sobre o tabuleiro.
Costumava iniciar as partidas colocando suas fichas em primeiro lugar sobre o
canto inferior esquerdo do tabuleiro, em seguida no centro, e, no final, no
quadro central superior. Sua contagem mostrava-se truncada e sempre acompanhada
pelos dedos das mãos. Neste momento, a organização de suas ações parecia não
levar em consideração as estratégias utilizadas pelo adversário.
No segundo momento do
uso do jogo da velha F. P. começou a organizar sua ação a partir da dimensão
numérica do jogo, embora persistisse sua preferência pela dimensão espacial do
tabuleiro. Manteve sua fixação em apenas uma de suas dimensões espaciais, a
diagonal, e sua estratégia de jogo quanto à posição das fichas no tabuleiro,
ainda sem levar em conta os movimentos do adversário. Em uma das partidas desta
fase, acabou por ganhar o jogo, mas suas ações não se constituíram reações ou
antecipações aos movimentos do adversário e, sim, a repetição de uma seqüência
de passos previamente testados. Ainda nesta fase, a escolha das fichas a serem
colocadas no tabuleiro foi aleatória, pois, ignorou a dimensão numérica do
jogo. Ao vencer a partida não somente quanto à posição das fichas, mas também
na contagem de seus pontos deu-se conta da importância do número da ficha
utilizada em sua última jogada. Sua contagem continuou truncada e acompanhada
dos dedos das mãos.
Na terceira fase do
atendimento com uso do jogo da velha F. P. manifestou um grande avanço na
elaboração e execução de suas estratégias de jogo. Passou a preocupar-se com as
duas dimensões envolvidas no jogo: espacial e numérica e começou a perceber
mais claramente as razões das vitórias consecutivas de seu adversário.
Apresentou uma pequena
variação em sua estratégia de jogo. Iniciou uma das partidas desta fase do
mesmo modo que as anteriores, mas acrescentou mais uma posição à sua
finalização: o canto superior direito do tabuleiro. Sua opção por uma ou outra
posição da ficha no final do jogo passa a depender dos movimentos do
adversário.
Esta opção
caracteriza-se como uma reação ao movimento do adversário e, portanto,
posterior a este.
Nesta partida, em suas
duas primeiras jogadas optou novamente por fichas com números baixos, mas ao
final percebeu que, embora tenha vencido quanto à posição das fichas no
tabuleiro perdeu em sua contagem de pontos. Deu-se conta de que a diferença de
pontos obtidos na partida foi conseqüência das fichas escolhidas pelos dois
jogadores. A partir daí passou a observar as quantidades presentes nas fichas
utilizadas pelo terapeuta, bem como a seqüência em que foram jogadas. Sua
contagem ainda permaneceu truncada e acompanhada dos dedos das mãos.
Na última etapa do jogo
da velha F.P. modificou suas estratégias de jogo e passou a utilizar cartas com
números maiores em pontos estratégicos do tabuleiro. As estratégias do
adversário tornaram-se modelos de ação. Passou a utilizar fichas de maior valor
desde as primeiras jogadas de cada partida e, ao mesmo tempo, a apresentar um
maior conjunto de variações das posições das fichas no tabuleiro. As jogadas
eram iniciadas e finalizadas em diferentes posições do tabuleiro, pois, a
estratégia de jogo era organizada não somente como reação aos movimentos do
adversário, mas também como antecipação a eles.
Em uma das partidas
desta fase o sujeito iniciou o jogo no canto superior direito, seguiu para o
canto superior esquerdo e previu a possibilidade de vencer fechando uma
seqüência na lateral esquerda do tabuleiro. Para isto, ignorou a ficha colocada
pelo adversário no quadro central do tabuleiro e jogou sua ficha na posição
central esquerda e, logo após, venceu o jogo fechando uma seqüência no canto inferior
esquerdo.
Ao vencer a partida
confirmou sua previsão quanto à melhor estratégia adotada nesta situação.
Nos dois casos
relatados os sujeitos modificaram suas estratégias de jogo tornando-as
operatórias. As estratégias utilizadas no início do desenvolvimento dos dois
jogos caracterizaram-se pela preocupação com apenas uma das variáveis
envolvidas na atividade de cada vez.
Ao longo do processo de
evolução de suas estratégias os sujeitos privilegiaram a cada momento apenas
uma das dimensões do jogo. No jogo da velha, no primeiro e segundo momento, F.
P. levou em conta apenas sua dimensão espacial para, no terceiro momento, priorizar
sua dimensão numérica, e apenas no último momento, levar em conta as duas
dimensões ao mesmo tempo. No jogo do bafo, no primeiro e segundo momento, J.P.
levou em conta apenas a quantidade de fichas viradas para, no terceiro momento,
priorizar a soma dos numerais contidos nas fichas, e apenas no último momento,
levar em conta as duas dimensões ao mesmo tempo: quantidadede fichas apostadas
e viradas e soma dos numerais contidos nas fichas.
Conclusões
Os resultados do
experimento evidenciam os progressos obtidos pelos sujeitos submetidos à
abordagem psicopedagógica dos conteúdos matemáticos e dos jogos convencionais
escolhidos, bafo e jogo da velha.
Nos dois casos
relatados, constatou-se evolução de suas estratégias de jogo e de seus
conhecimentos sobre as operações de adição e subtração.
As estratégias iniciais
dos dois jogadores demonstravam umaconduta indiferente aos elementos
matemáticos introduzidos nos jogos e organizavam suas jogadas, conforme os
procedimentos convencionalmente utilizados nos dois jogos.
No jogo do bafo J.P.
preocupava-se apenas em virar as figuras o mais rápido possível, enquanto no
jogo da velha F.P. fixava-se em uma das dimensões espaciais do tabuleiro, a
diagonal.
Ao lidar com apenas uma
das duas dimensões implicadas nos jogos os sujeitos evidenciaram uma conduta
não operatória, embora a tivessem manifestado em outras situações1.
Em uma etapa posterior
os dois jogadores passaram a levar em conta a dimensão numérica dos dois jogos
abandonando temporariamente a dimensão espacial. A utilização da dimensão
numérica nos jogos, embora de maneira restrita, sugere a manutenção de sua
conduta não operatória.
A última etapa de
evolução das estratégias de jogo dos sujeitos representou a utilização de
diferentes variáveis contidas tanto na dimensão numérica dos jogos – no jogo do
bafo quantidade de fichas, valor de cada uma e sua soma, e no jogo da velha o
valor de cada ficha e sua soma, quanto em sua dimensão espacial – no jogo da
velha a posição diagonal, horizontal e vertical das fichas.
Em provas piagetianas
aplicadas aos dois sujeitos observou-se a manifestação do estágio de pensamento
operatório concreto.
O novo comportamento
introduzido nos dois jogos evidenciou uma conduta operatória nos procedimentos
dos dois jogadores. Ao beneficiar-se de sua operatoriedade na organização das
estratégias de jogo os sujeitos indicaram ter sido capazes de utilizar
adequadamente seus recursos cognitivos. A ativação pertinente dos recursos
cognitivos disponíveis em seu sistema cognitivo é um dos indicadores, segundo
Perrenoud (1999), do desenvolvimento de competências por parte dos indivíduos.
Os progressos obtidos
pelos dois jogadores ao longo do experimento demonstram a importância da
abordagem psicopedagógica da matemática e dos jogos convencionais para a
melhoria do desempenho dos sujeitos nas duas áreas. Além de modificar suas
estratégias de jogo, os sujeitos modificaram suas estratégias de soma das
quantidades contidas nas fichas de jogo e dos pontos obtidos nas partidas.
Ambos deixaram de realizar
esta operação por meio da contagem dos dedos e passaram a efetuá-la por meio do
cálculo mental. Tais resultados confirmam os obtidos em estudos anteriores por
Brenelli (1996) e Calsa (2002).
Brenelli (1996)
observou que a abordagem psicopedagógica dos jogos de regras favorece o
desenvolvimento das estruturas cognitivas, pois, permite que o sujeito realize
descentrações e coordenações de pontos de vista, bem como, o desencadeamento de
regulações ativas no processo de escolha de procedimentos adequados ao alcance
dos objetivos do jogo.
Em seu estudo,
realizado com crianças de faixa etária equivalente ao deste relato, a autora
constatou que ao modificar sua maneira de jogar a criança mostra que foi capaz
de compensar as perturbações provocadas pelo jogo, na tentativa de se acomodar
às suas exigências. Dessa perspectiva, podese afirmar que por meio do jogo o
sujeito exercitou suas funções intelectuais de assimilação e acomodação,
fatores, em parte, responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo dos sujeitos.
Calsa (2002), em outro
estudo com faixa etária equivalente ao desta pesquisa, concluiu que a abordagem
psicopedagógica de conteúdos matemáticos é capaz de melhorar o desempenho de
alunos com rendimento insatisfatório nesta matéria. Durante o processo de intervenção
os alunos apresentaram um movimento de retomada de formas mais primitivas de
resolução de tarefas para, ao longo do processo, chegar até formas mais
avançadas e compatíveis com sua faixa etária.
Finalizando, é
importante assinalar que os resultados da experiência relatada neste artigo
mostram a importância de intervenções de caráter psicopedagógico para a
modificação do modelo de aprendizagem dos indivíduos em situação terapêutica, e
sugerem sua viabilidade em situação escolar para a melhoria da aprendizagem de
seus alunos.
Referências
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VISCA, J. Clínica
Psicopedagógica. Epistemologia convergente. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987
Diagnóstico
Psicopedagógico: o desafio de montar um quebra-cabeças
Fernández (1990) afirma
que o diagnóstico, para o terapeuta, deve ter a mesma função que a rede para um
equilibrista. É ele, portanto, a base que dará suporte ao psicopedagogo para
que este faça o encaminhamento necessário.
É um processo que
permite ao profissional investigar, levantar hipóteses provisórias que serão ou
não confirmadas ao longo do processo recorrendo, para isso, a conhecimentos
práticos e teóricos. Esta investigação permanece durante todo o trabalho
diagnóstico através de intervenções e da "...escuta
psicopedagógica...", para que "...se possa decifrar os processos que
dão sentido ao observado e norteiam a intervenção". (BOSSA, 2000, p. 24).
Na Epistemologia Convergente
todo o processo diagnóstico é estruturado para que se possa observar a dinâmica
de interação entre o cognitivo e o afetivo de onde resulta o funcionamento do
sujeito (BOSSE, 1995, p. 80)
Conforme Weiss,
O objetivo básico do
diagnóstico psicopedagógico é identificar os desvios e os obstáculos básicos no
Modelo de Aprendizagem do sujeito que o impedem de crescer na aprendizagem
dentro do esperado pelo meio social. (2003, p. 32 )
O diagnóstico possui
uma grande relevância tanto quanto o tratamento. Ele mexe de tal forma com o
paciente e sua família que, por muitas vezes, chegam a acreditar que o sujeito
teve uma melhora ou tornou-se agressivo e agitado no decorrer do trabalho
diagnóstico. Por isso devemos fazer o diagnóstico com muito cuidado observando
o comportamento e mudanças que isto pode acarretar no sujeito.
Para ilustrar como o
diagnóstico interfere na vida do sujeito e sua família, citaremos um exemplo de
Weiss: uma paciente, uma adolescente de 18 anos cursando a 7ª série de escola
especial, queixou-se à mãe que ela (Weiss) estava forçando-a a crescer. Ela
conseguiu fazer a elaboração deste pensamento porque tinha medo de perder o
papel na família da doente que necessitava de atenção exclusiva para ela. A
família percebeu que isto realmente poderia acontecer e era isto também que
sustentava seu casamento "já acabado". Concordou com a terapeuta em
interromper o diagnóstico (2003, p. 33 ).
Bossa nos lembra que a
forma de se operar na clínica para se fazer um diagnóstico varia entre os
profissionais dependendo da postura teórica adotada. (p. 96, 2000).
Na linha da
Epistemologia Convergente, Visca nos informa que o diagnóstico começa com a
consulta inicial (dos pais ou do próprio paciente) e encerra com a devolução
(1987, p. 69).
Antes de se iniciar as
sessões com o sujeito faz-se uma entrevista contratual com a mãe e/ou o pai
e/ou responsável, objetivando colher informações como:
- Identificação da
criança: nome, filiação, data de nascimento, endereço, nome da pessoa que cuida
da criança, escola que freqüenta, série, turma, horário, nome da professora,
irmãos, escolaridades dos irmãos, idade dos irmãos.
- Motivo da consulta;
- Procura do
Psicopedagogo: indicação;
- Atendimento anterior;
- Expectativa da
família e da criança;
- Esclarecimento sobre
o trabalho psicopedagógico.
- Definição de local,
data e horário para a realização das sessões e honorários.
Visca propôs o seguinte
Esquema Seqüencial Proposto pela Epistemologia Convergente:
Ações do entrevistador
Procedimentos Internos do Entrevistador
EOCA
Testes
Anamnese
Elaboração do Informe
1º sistema de hipóteses
Linhas de investigação
Escolha de instrumentos
2º sistema de hipóteses
Linhas de investigação
Verificação e
decantação do 2º sistema de hipótese.
Formulação do 3º
sistema de hipóteses
Elaboração de uma
imagem do sujeito (irrepetível) que articula a aprendizagem com os aspectos
energéticos e estruturais, a-históricos e históricos que a condicionam.
(VISCA, 1991)
Observamos, no quadro
acima, que ele propõe iniciar o diagnóstico com a EOCA e não com a anamnese
argumentando que "... os pais, invariavelmente ainda que com intensidades
diferentes, durante a anamnese tentam impor sua opinião, sua ótica, consciente
ou inconscientemente. Isto impede que o agente corretor se aproxime
'ingenuamente' do paciente para vê-lo tal como ele é, para descobri-lo. (Id.
Ibid., 1987, p. 70).
Os profissionais que
optam pela linha da Epistemologia Convergente realizam a anamnese após as provas
para que não haja "contaminação" pelo bombardeio de informações
trazidas pela família, o que acabaria distorcendo o olhar sobre aquela criança
e influenciando no resultado do diagnóstico.
Porém, alguns
profissionais iniciam o diagnóstico com a anamnese. É o caso de Weiss. Compare
abaixo o quadro da seqüência diagnóstica proposta por ela:
1º - Entrevista
Familiar Exploratória Situacional (E.F.E.S.)
2º - Anamnese
3º - Sessões lúdicas
centradas na aprendizagem (para crianças)
4º - Complementação com
provas e testes (quando for necessário)
5º - Síntese
Diagnóstica – Prognóstico
6º - Devolução -
Encaminhamento
(WEISS, 1994)
Esta diferença não
altera o resultado do diagnóstico, porém é preciso que o profissional acredite
na linha em que escolheu para seu trabalho psicopedagógico.
Como o presente
trabalho está baseado na Epistemologia Convergente abordaremos a anamnese ao
final e iniciaremos falando sobre a EOCA.
A realização da EOCA
tem a intenção de investigar o modelo de aprendizagem do sujeito sendo sua prática
baseada na psicologia social de Pichón Rivière, nos postulados da psicanálise e
método clínico da Escola de Genebra (BOSSA, 2000, p. 44).
Para Visca, a EOCA
deverá ser um instrumento simples, porém rico em seus resultados. Consiste em
solicitar ao sujeito que mostre ao entrevistador o que ele sabe fazer, o que
lhe ensinaram a fazer e o que aprendeu a fazer, utilizando-se de materiais
dispostos sobre a mesa, após a seguinte observação do entrevistador: "este
material é para que você o use se precisar para mostrar-me o que te falei que
queria saber de você" (VISCA, 1987, p. 72).
O entrevistador poderá
apresentar vários materiais tais como: folhas de ofício tamanho A4, borracha,
caneta, tesoura, régua, livros ou revistas, barbantes, cola, lápis, massa de
modelar, lápis de cor, lápis de cera, quebra-cabeça ou ainda outros materiais
que julgar necessários.
O entrevistado tende a
comportar-se de diferentes maneiras após ouvir a consigna. Alguns
imediatamente, pegam o material e começam a desenhar ou escrever etc. Outros
começam a falar, outros pedem que lhe digam o que fazer, e outros simplesmente
ficam paralisados. Neste último caso, Visca nos propõe empregar o que ele
chamou de modelo de alternativa múltipla (1987, p. 73), cuja intenção é
desencadear respostas por parte do sujeito. Visca nos dá um exemplo de como
devemos conduzir esta situação: "você pode desenhar, escrever, fazer
alguma coisa de matemática ou qualquer coisa que lhe venha à cabeça..."
(1987, p. 73).
Vejamos o que Sara Paín
nos fala sobre esta falta de ação na atividade "A hora do jogo"
(atividade trabalhada por alguns psicólogos ou Psicopedagogos que não se aplica
à Epistemologia Convergente, porém é interessante citar para percebermos a
relação do sujeito com o objeto):
No outro extremo encontramos
a criança que não toma qualquer contato com os objetos. Às vezes se trata de
uma evitação fóbica que pode ceder ao estímulo. Outras vezes se trata de um
desligamento da realidade, uma indiferença sem ansiedade, na qual o sujeito se
dobra às vezes sobre seu próprio corpo e outras vezes permanece numa atividade
quase catatônica. (1992, p. 53).
Piaget, em Psicología
de la Inteligência, coloca que:
O indivíduo não atua
senão quando experimenta a necessidade; ou seja; quando o equilíbrio se acha
momentaneamente quebrado entre o meio e o organismo, a ação tende a
reestabelecer este equilíbrio, quer dizer, precisamente, a readaptar o
organismo... (PIAGET apud VISCA, 1991, p. 41).
De acordo com Visca, o
que nos interessa observar na EOCA são "...seus conhecimentos, atitudes,
destrezas, mecanismos de defesa, ansiedades, áreas de expressão da conduta,
níveis de operatividade, mobilidade horizontal e vertical etc (1987, p. 73).
É importante também
observar três aspectos que fornecerão um sistema de hipóteses a serem
verificados em outros momentos do diagnóstico:
• A temática - é tudo
aquilo que o sujeito diz, tendo sempre um aspecto manifesto e outro latente;
• A dinâmica - é tudo
aquilo que o sujeito faz, ou seja, gestos, tons de voz, postura corporal, etc).
A forma de pegar os materiais, de sentar-se são tão ou mais reveladores do que
os comentários e o produto.
• O produto - é tudo
aquilo que o sujeito deixa no papel.
(Id. Ibid., 1987, p.
74)
Visca (1987) observa
que o que obtemos nesta primeira entrevista é um conjunto de observações que
deverão ser submetidas a uma verificação mais rigorosa, constituindo o próximo
passo para o processo diagnóstico.
É da EOCA que o
psicopedagogo extrairá o 1º Sistema de hipóteses e definirá sua linha de
pesquisa. Logo após são selecionadas as provas piagetianas para o diagnóstico
operatório, as provas projetivas psicopedagógicas e outros instrumentos de
pesquisa complementares.
Visca reuniu em seu
livro: El diagnostico operatório em la practica psicopedagogica, as provas
operatórias aplicadas no método clínico da Escola de Genebra por Piaget, no
qual expõe sucintamente os passos em que usou com grupos de estudo e cursos
para o ensino do diagnóstico psicopedagógico, comentando o porque de cada
passo.
A aplicação das provas
operatórias tem como objetivo determinar o nível de pensamento do sujeito
realizando uma análise quantitativa, e reconhecer a diferenças funcionais
realizando um estudo predominantemente qualitativo. (Id. Ibid., p. 11, 1995).
O autor nos alerta que
as provas "...no siempre han sido adecuadamente entendidas y utilizadas de
acuerdo com todas las posibilidades que las mismas poseen" (1995, p. 11).
Isto se deve, talvez, a uma certa dificuldade de sua correta aplicação,
evolução e extração das conclusões úteis para entender a aprendizagem.
Segundo Weiss:
As provas operatórias
têm como objetivo principal determinar o grau de aquisição de algumas
noções-chave do desenvolvimento cognitivo, detectando o nível de pensamento
alcançado pela criança, ou seja, o nível de estrutura cognoscitiva com que
opera (2003, p. 106).
Ela ainda nos alerta
que não se deve aplicar várias provas de conservação em uma mesma sessão, para
se evitar a contaminação da forma de resposta. Observa que o psicopedagogo
deverá fazer registros detalhados dos procedimentos da criança, observando e
anotando suas falas, atitude, soluções que dá às questões, seus argumentos e
juízos, como arruma o material. Isto será fundamental para a interpretação das
condutas.
Para a avaliação as
respostas são divididas em três níveis:
• Nível 1: Não há
conservação, o sujeito não atinge o nível operatório nesse domínio.
• Nível 2 ou
intermediário: As respostas apresentam oscilações, instabilidade ou não são
completas. Em um momento conservam, em outro não.
• Nível 3: As respostas
demonstram aquisição da noção sem vacilação.
Muito interessante o
que Weiss nos diz sobre as diferentes condutas em provas distintas:
...pode ocorrer que o
paciente não obtenha êxito em apenas uma prova, quando todo o conjunto sugere a
sua possibilidade de êxito. Pode-se ver se há um significado particular para a
ação dessa prova que sofra uma interferência emocional: encontramos várias
vezes crianças, filhos de pais separados e com novos casamentos dos pais, que
só não obtinham êxito na prova de intersecção de classes. Podemos ainda citar
crianças muito dependentes dos adultos que ficam intimidadas com a
contra-argumentação do terapeuta, e passam a concordar com o que ele fala,
deixando de lado a operação que já são capazes de fazer (2003, p. 111).
Em relação a crianças
com alguma deficiência mental ela nos diz que:
No caso de suspeita de
deficiência mental, os estudos de B. Inhelder (1944) em El diagnóstico del
razonamiento en los débiles mentales mostram que os oligofrênicos (QI 0-50) não
chegam a nenhuma noção de conservação; os débeis mentais (QI 50-70) chegam a
ter êxito na prova de conservação de substância; os fronteiriços (QI 70-80)
podem chegar a ter sucesso na prova de conservação de peso; os chamados de
inteligência normal "obtusa" ou "baixa", podem obter êxito
em provas de conservação de volume, e às vezes, quando bem trabalhados, podem
atingir o início do pensamento formal (2003, p.111-112).
Visca também reuniu em
um outro livro: Técnicas proyetivas psicopedagogicas, as provas projetivas,
cuja aplicação tem como objetivo investigar os vínculos que o sujeito pode
estabelecer em três grandes domínios: o escolar, o familiar e consigo mesmo,
através dos quais é possível reconhecer três níveis em relação ao grau de
consciência dos distintos aspectos que constituem o vínculo de aprendizagem.
Sobre as provas
projetivas Weiss observa que:
O princípio básico é de
que a maneira do sujeito perceber, interpretar e estruturar o material ou situação
reflete os aspectos fundamentais do seu psiquismo. É possível, desse modo,
buscar relações com a apreensão do conhecimento como procurar, evitar,
distorcer, omitir, esquecer algo que lhe é apresentado. Podem-se detectar,
assim, obstáculos afetivos existentes nesse processo de aprendizagem de nível
geral e especificamente escolar (2003, p. 117)
Para Sara Paín, o que
podemos avaliar através do desenho ou relato é a capacidade do pensamento para
construir uma organização coerente e harmoniosa e elaborar a emoção. Também
permitirá avaliar a deteriorização que se produz no próprio pensamento. Esta
autora ainda nos diz que o pensamento fala através do desenho onde se diz mal
ou não se diz nada, o que oferece a oportunidade de saber como o sujeito ignora
(1992, p. 61).
De acordo com a
Epistemologia Convergente, após a aplicação das provas operatórias e das
técnicas projetivas o psicopedagogo levantará o 2º Sistema de hipóteses e
organizará sua linha de pesquisa para a anamnese que, como já vimos, terá lugar
no final do processo diagnóstico, de modo a não contaminar previamente a
percepção do avaliador.
Weiss nos diz que:
As observações sobre o
funcionamento cognitivo do paciente não são restritas às provas do diagnóstico
operatório; elas devem ser feitas ao longo do processo diagnóstico. Na anamnese
verifica-se com os pais como se deu essa construção e as distorções havidas no
percurso;... (2003, p.106).
A anamnese é uma das
peças fundamentais deste quebra-cabeça que é o diagnóstico. Através dela nos
serão reveladas informações do passado e presente do sujeito juntamente com as
variáveis existentes em seu meio. Observaremos a visão da família sobre a
história da criança, seus preconceitos, expectativas, afetos, conhecimentos e
tudo aquilo que é depositado sobre o sujeito.
... toda anamnese já é,
em si, uma intervenção na dinâmica familiar em relação à "aprendizagem de
vida". No mínimo se processa uma reflexão dos pais, um mergulho no
passado, buscando o início da vida do paciente, o que inclui espontaneamente uma
volta à própria vida da família como um todo (Id. Ibid., 2003, p. 63).
Segundo Weiss, o
objetivo da anamnese é "colher dados significativos sobre a história de
vida do paciente" (2003, p. 61).
Consiste em entrevistar
o pai e/ou a mãe, ou responsável para, a partir disso, extrair o máximo de
informações possíveis sobre o sujeito, realizando uma posterior análise e
levantamento do 3º sistema de hipóteses. Para isto é preciso que seja muito bem
conduzida e registrada.
O psicopedagogo deverá
deixá-los à vontade "... para que todos se sintam com liberdade de expor
seus pensamentos e sentimentos sobre a criança para que possam compreender os
pontos nevrálgicos ligados à aprendizagem". (Id. Ibid., 2003, p. 62).
Deixá-los falar
espontaneamente permite ao psicopedagogo avaliar o que eles recordam para
falar, qual a seqüência e a importância dos fatos. O psicopedagogo deverá
complementar ou aprofundar.
Conforme Weiss, em
alguns casos deixa-se a família falar livremente. Em outros, a depender das
características da família, faz-se necessário recorrer a perguntas sempre que
necessário. Os objetivos deverão estar bem definidos, e a entrevista deverá ter
um caráter semidiretivo (2003, p. 64).
De acordo com Paín, a
história vital nos permitirá "...detectar o grau de individualização que a
criança tem com relação à mãe e a conservação de sua história nela" (1992,
p. 42).
É importante iniciar a
entrevista falando sobre a gravidez, pré-natal, concepção. Weiss nos informa
que,
"A história do
paciente tem início no momento da concepção. Os estudos de Verny (1989) sobre a
Psicologia pré-natal e perinatal vêm reforçar a importância desses momentos na
vida do indivíduo e, de algum modo, nos aspectos inconscientes de
aprendizagem" (2003, p. 64).
Algumas circunstâncias
do parto como falta de dilatação, circular de cordão, emprego de fórceps,
adiamento de intervenção de cesárea, "costumam ser causa da destruição de
células nervosas que não se reproduzem e também de posteriores transtornos,
especialmente no nível de adequação perceptivo-motriz" (PAÍN, 1992, p.
43).
É interessante
perguntar se foi uma gravidez desejada ou não, se foi aceito pela família ou
rejeitado. Estes pontos poderão determinar aspectos afetivos dos pais em
relação ao filho.
Posteriormente é
importante saber sobre as primeiras aprendizagens não escolares ou informais,
tais como: como aprendeu a usar a mamadeira, o copo, a colher, como e quando
aprendeu a engatinhar, a andar, a andar de velocípede, a controlar os
esfíncteres, etc. A intenção é descobrir "em que medida a família
possibilita o desenvolvimento cognitivo da criança - facilitando a construção
de esquemas e deixando desenvolver o equilíbrio entre assimilação e
acomodação...". (WEISS, 2003, p.66).
É interessante saber
sobre a evolução geral da criança, como ocorreram seus controles, aquisição de
hábitos, aquisição da fala, alimentação, sono etc., se ocorreram na faixa
normal de desenvolvimento ou se houve defasagens.
Se a mãe não permite
que a criança faça as coisas por si só, não permite também que haja o equilíbrio
entre assimilação e acomodação. Alguns pais retardam este desenvolvimento
privando a criança de, por exemplo, comer sozinha para não se lambuzar, tirar
as fraldas para não se sujar e não urinar na casa, é o chamado de
hipoassimilação (PAÍN, 1992), ou seja, os esquemas de objeto permanecem
empobrecidos, bem como a capacidade de coordená-los.
Por outro lado há casos
de internalização prematura dos esquemas, é o chamado de hiperassimilação
(PAÍN, 1992), pais que forçam a criança a fazer determinadas coisas das quais
ela ainda não está preparada para assimilar, pois seu organismo ainda está
imaturo, o que acaba desrealizando negativamente o pensamento da criança.
Sobre o que acabamos de
mencionar Sara Paín nos diz que é interessante saber se as aquisições foram
feitas pela criança no momento esperado ou se foram retardadas ou precoces.
"Isto nos permite estabelecer um quociente aproximado de desenvolvimento,
que se comparará com o atual, para determinar o deterioramento ou incremento no
processo de evolução" (1992, p. 45).
A mesma autora
aconselha insistirmos "... nas modalidades para a educação do controle dos
esfíncteres quando apareçam perturbações na acomodação... " (1992, p. 42).
Weiss nos orienta
também saber sobre a história clínica, quais doenças, como foram tratadas, suas
conseqüências, diferentes laudos, seqüelas.
A história escolar é
muito importante, quando começou a freqüentar a escola, sua adaptação, primeiro
dia de aula, possíveis rejeições, entusiasmo, porque escolheram aquela escola,
trocas de escola, enfim, os aspectos positivos e negativos e as conseqüências
na aprendizagem.
Todas estas as
informações essenciais da anamnese devem ser registradas para que se possa
fazer um bom diagnóstico.
Encerrada a anamnese, o
psicopedagogo levantará o 3º sistema de hipóteses. A anamnese deverá ser
confrontada com todo o trabalho do diagnóstico para se fazer a devolução e o
encaminhamento.
Devolução no dicionário
é o ato de devolver, de dar de volta (ROCHA, 1996, p. 208). No sentido da
clínica psicopedagógica a devolução é uma comunicação verbal, feita aos pais e
ao paciente, dos resultados obtidos através de uma investigação que se utilizou
do diagnóstico para obter resultados.
"... talvez o
momento mais importante desta aprendizagem seja a entrevista dedicada à
devolução do diagnóstico, entrevista que se realiza primeiramente com o sujeito
e depois com os pais (quando se trata de uma criança, é claro)" (PAÍN,
1992, p. 72).
Segundo Weiss, no caso
da criança, é preciso fazer a devolução utilizando-se de uma linguagem adequada
e compreensível para sua idade para que não fique parecendo que há segredos
entre o terapeuta e os pais, ou que o terapeuta os traiu (1992, p. 130).
É perfeitamente normal
que, neste momento, exista muita ansiedade para todos os envolvidos no
processo, seja o psicopedagogo, o paciente e os pais. Muitas vezes algumas
suspeitas observadas ao longo do diagnóstico tendem a se revelar no momento da
devolução, "ficam evidentes nestas falas as fantasias que chegam ao
momento da devolução, e que estiveram presentes durante todo o processo
diagnóstico" (Id. Ibid., 2003, p. 130).
Alguns pais chegam à
devolução sem terem consciência ou camuflam o que sabem sobre seu filho. É
preciso tomar consciência da situação e providenciar suas transformações, caso
contrário, não será possível realizar um contrato de tratamento.
Weiss orienta organizar
os dados sobre o paciente em três áreas: pedagógica, cognitiva e
afetivo-social, e posteriormente rearrumar a seqüência dos assuntos a serem
abordados, a que ponto dará mais ênfase. É necessário haver um roteiro para que
o psicopedagogo não se perca e os pais não fiquem confusos. Tudo deve ser feito
com muito afeto e seriedade, passando segurança. Os pais, assim, muitas vezes
acabam revelando algo neste momento que surpreende e acaba complementando o
diagnóstico.
É importante que se
toque inicialmente nos aspectos mais positivos do paciente para que o mesmo se
sinta valorizado. Muitas vezes a criança já se encontra com sua auto-estima tão
baixa que a revelação apenas dos aspectos negativos acabam perturbando-o ainda
mais, o que acaba por inviabilizar a possibilidade para novas conquistas.
Depois deverão ser
mencionados os pontos causadores dos problemas de aprendizagem.
Posterior a esta
conduta deverá ser mencionada as recomendações como troca de escola ou de
turma, amenizar a super-proteção dos pais, estimular a leitura em casa etc, e
as indicações que são os atendimentos que se julgue necessário como
psicopedagogo, fonoaudiólogo, psicólogo, neurologista etc.
Em casos de quadros
psicóticos, neuroses graves ou outras patologias, é necessário um tratamento
psicoterápico inicial, até que o paciente atinja um ponto tal que tenha
condições de perceber a sua própria necessidade de aprender e crescer no que
respeita à escolaridade; é preciso que se instale nele o desejo de aprender
(Weiss, 2003, p. 136).
Muitas vezes faz-se
necessário o encaminhamento para mais de um profissional. E isto complica
quando a família pertence a um baixo nível socioeconômico. É importante que no
momento da devolução o psicopedagogo tenha algumas indicações de instituições
particulares e públicas que ofereçam serviços gratuitos ou com diferentes
formas pagamento. Isto evita que o problema levantado pelo diagnóstico não
fique sem uma posterior solução.
O informe é um laudo do
que foi diagnosticado. Ele é solicitado muitas vezes pela escola, outros
profissionais etc. Quaisquer que sejam os solicitantes é importante não redigir
o mesmo laudo, pois existem informações que devem ser resguardadas, ou seja,
para cada solicitante deve-se redigir informações convenientes. Sua finalidade
é "resumir as conclusões a que se chegou na busca de respostas às
perguntas que motivaram o diagnóstico" (Id. Ibid., 2003, p. 138).
A mesma autora sugere o
seguinte roteiro para o informe:
I. Dados pessoais;
II. Motivo da avaliação
- encaminhamento;
III. Período da
avaliação e número de sessões;
IV. Instrumentos
usados;
V. Análise dos
resultados nas diferentes áreas: pedagógica, cognitiva, afetivo-social,
corporal.
VI. Síntese dos
resultados - hipótese diagnóstica;
VII. Prognóstico;
VIII. Recomendações e
indicações;
IX. Observações:
acréscimo de dados conforme casos específicos.
Bibliografia:
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Dificuldades de Aprendizagem: O que são? Como Tratá-las? Porto Alegre, Artes
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WEISS, M. L. L.
Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem
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