quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

FRACASSO ESCOLAR NA ALFABETIZAÇÃO: UM OLHAR A PARTIR DA PSICOPEDAGOGIA
Fernanda Figueira Marquezan**, Carmen Rosane Segatto e Souza***
A criança, mesmo não reconhecendo os símbolos do alfabeto, já "lê" o seu meio, estabelecendo relações entre significante e significado.
O propósito do estudo foi refletir sobre o papel da psicopedagogia preventiva no fracasso escolar durante a alfabetização, devido à desatenção que tem sofrido o ensino da leitura e da escrita, e o baixo rendimento escolar, nas primeiras séries do Ensino Fundamental. Também, a importância do trabalho psicopedagógico preventivo que se baseia principalmente na observação e análise profunda de uma situação concreta, no sentido de detectar possíveis perturbações no processo de aprendizagem. O estudo caracterizou-se como uma pesquisa de campo do tipo descritiva exploratória. A amostra constituiu-se de 08 professores alfabetizadores de escolas públicas e particulares de Santa Maria-RS. Para coleta das informações, utilizou-se um questionário contendo perguntas abertas e fechadas, aplicado sob forma de entrevista. Os dados analisados, mostram que do total de professores entrevistados a maioria se deparam com alunos que apresentaram dificuldades na leitura e na escrita. No estudo, constatou-se que o fracasso na alfabetização ainda hoje faz parte do cotidiano das nossas escolas.


PALAVRAS-CHAVE: Fracasso escolar – Alfabetização – Psicopedagogia
1. INTRODUÇÃO
Na atualidade, várias pesquisas têm sido realizadas na busca de compreender o fracasso escolar na alfabetização tendo em vista os problemas que a leitura e a escrita apresentam à educação (PATTO, 1996; MICOTTI, 1987; SCOZ, 1994). Essas pesquisas indicam a existência de
problemas no processo de ensino-aprendizagem da linguagem na primeira série, isto é, problemas relativos à alfabetização, pois é na primeira série que normalmente ocorre à alfabetização.
O educando chega à escola com um grande número de experiências, de aprendizagens que são ignoradas pelo professor, pois mesmo antes de ingressar na escola a criança já possui inúmeras vivências que deveriam servir como ponto de partida das atividades do professor.
A criança, mesmo não reconhecendo os símbolos do alfabeto, já "lê" o seu meio, estabelecendo relações entre significante e significado. A escola deve dar continuidade a esse processo defendendo a livre expressão da criança, pois com isso o educando enfrentará com mais tranqüilidade a grande aventura do primeiro ano escolar: aprender a ler e escrever.
Nesse sentido, é necessário que os educadores tenham conhecimentos que lhes possibilitem compreender sua prática e os meios necessários para promoverem o progresso e o sucesso dos alunos. Uma das maneiras de se chegar a isso é através das contribuições que a Psicopedagogia proporciona, pois é a área que estuda e lida com o processo da aprendizagem e com os problemas dele decorrentes. Sua nova visão vem sendo apresentada pela
Psicopedagogia e vem ganhando espaço nos meios educacionais brasileiros, despertando o interesse dos profissionais que atuam nas escolas e buscam subsídios para sua prática.
Em função dessa realidade educacional identificada com base nas colocações referidas, buscou-se, a partir desta pesquisa refletir o papel da psicopedagogia preventiva no fracasso escolar na alfabetização.
O interesse em pesquisar a forma como a intervenção psicopedagógica pode contribuir para a prevenção do fracasso escolar na alfabetização é devido à desatenção que tem sofrido o ensino da leitura e da escrita, e o baixo rendimento escolar, nas primeiras séries do Ensino Fundamental; e como também, devido à importância do trabalho psicopedagógico preventivo que se baseia principalmente na observação e análise profunda de uma situação concreta, no sentido de detectar possíveis perturbações no processo de aprendizagem promovendo orientações didático-metodológicas de acordo com as características dos indivíduos e grupos.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 A PSICOPEDAGOGIA NA INSTUIÇÃO ESCOLAR
A Psicopedagogia se ocupa da aprendizagem humana, e surgiu de uma demanda: o problema de aprendizagem, colocado num território pouco explorado, situado além dos limites da Psicologia e da própria Pedagogia. Como se preocupa com os problemas de aprendizagem, o psicopedagogo deve ocupar-se inicialmente com o processo de aprendizagem, como se aprende, como essa aprendizagem varia, e como se produzem as alterações na aprendizagem, como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las.
Segundo BOSSA, o objeto central de estudo da Psicopedagogia está se estruturando em torno do processo de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e patológicos, bem como a influência do meio (família, escola, sociedade) no seu desenvolvimento (apud Kiguel, 1994, p. 8).
O trabalho na instituição escolar apresenta duas naturezas: o primeiro diz respeito a uma psicopedagogia voltada para o grupo de alunos que apresentam dificuldades na escola. O seu objetivo é reintegrar e readaptar o aluno à situação de sala de aula, possibilitando o respeito às suas necessidades e ritmos. Tendo como meta desenvolver as funções cognitivas integradas ao afetivo, desbloquendo e canalizando o aluno gradualmente para a aprendizagem dos conceitos, conforme os objetivos da aprendizagem formal. O segundo tipo de trabalho refere-se à assessoria junto à pedagogos, orientadores e professores. Tem como objetivo trabalhar as questões pertinentes às relações vinculares professor-aluno e redefinir os procedimentos pedagógicos, integrando o afetivo e o cognitivo, através da aprendizagem dos
O trabalho na instituição escolar apresenta duas naturezas: o primeiro diz respeito a uma psicopedagogia voltada para o grupo de alunos que apresentam dificuldades na escola. O seu objetivo é reintegrar e readaptar o aluno à situação de sala de aula, possibilitando o respeito às suas necessidades e ritmos. Tendo como meta desenvolver as funções cognitivas integradas ao afetivo, desbloquendo e canalizando o aluno gradualmente para a aprendizagem dos conceitos, conforme os objetivos da aprendizagem formal. O segundo tipo de trabalho refere-se à assessoria junto à pedagogos, orientadores e professores. Tem como objetivo trabalhar as questões pertinentes às relações vinculares professor-aluno e redefinir os procedimentos pedagógicos, integrando o afetivo e o cognitivo, através da aprendizagem dos conceitos, as diferentes áreas do conhecimento.
Segundo BOSSA (1994, p. 13), no exercício preventivo, pode-se falar em três níveis de prevenção:
No primeiro nível, o psicopedagogo atua no sentido de diminuir afreqüência dos problemas de aprendizagem. Seu trabalho recai nas questões didático-metodológicas, bem como na formação e orientação de professores, além de fazer aconselhamento aos pais. No segundo nível, o objetivo é diminuir e tratar dos problemas de aprendizagem já instalados, a partir das quais procura-se avaliar os currículos com os professores para que não se repitam tais transtornos. No terceiro nível, o objetivo é eliminar os transtornos já instalados, num procedimento clínico com todas as suas implicações. O caráter preventivo permanece aí, uma vez que, ao eliminarmos um transtorno, estamos prevenindo o aparecimento de outros.
Na sua tarefa junto às instituições escolares, o psicopedagogo, numa ação preventiva, deve adotar uma postura crítica frente ao fracasso escolar, visando propor novas alterações de ação voltadas para a melhoria da prática pedagógica nas escolas.
Segundo FERNÁNDEZ:
Para resolver o fracasso escolar necessitamos recorrer principalmente a planos de prevenção nas escolas – batalhar para que o professor possa ensinar com prazer para que, por isso, seu aluno possa aprender com prazer, tende a denunciar a violência encoberta e aberta, instalada no sistema educativo, entre outros objetivos... (1990, p. 81-82).
2.2 FRACASSO ESCOLAR NA ALFABETIZAÇÃO
A aprendizagem da leitura e escrita constitui-se uma das tarefas básicas propostas à educação. Aparentemente simples, essa tarefa constitui, no entanto, um dos problemas educacionais da atualidade que mais chama atenção, por isso tem sido objeto de estudo. O assunto tem sido questionado por parte de pais, professores e especialistas em educação não só no que diz respeito ao domínio da escrita propriamente dita, mas às repercussões dessa aprendizagem nos vários aspectos da escolaridade.
Quando uma criança ingressa na escola, sua primeira tarefa é aprender a ler e escrever, sendo a alfabetização o centro das expectativas de pais e professores. Os pais a e própria criança não têm, em geral, razão para duvidarem do sucesso nessa nova aprendizagem. No entanto, o que muitas vezes os pais e professores não consideram, é que a leitura e a escrita são habilidades que exigem da criança a atenção para aspectos da linguagem aos quais ela não precisa dar importância, até o momento em que começa aprender a ler e escrever. Por isso, toda a criança encontra alguma dificuldade na aprendizagem da leitura e da escrita.
Aprender a ler exige novas habilidades, novos desafios à criança com relação ao seu conhecimento da linguagem. Por isso, aprender a ler é uma tarefa complexa e difícil para todas as crianças.
Quando as crianças não conseguem atender às expectativas da professora, supõe-se e conclui-se que elas têm problemas, pois a escola constrói um modelo de bom aluno, mas nem todas crianças se adaptam dentro desse modelo, quando isso acontece os professores recorrem as muletas para explicar tal situação: "estas crianças não podem aprender porque não há ajuda familiar, falta de maturidade, suposta lesão cerebral mínima ou transtornos do tipo: psicomotora, na fonação, percepção, etc..."(FERREIRO, 1989, p. 73).
Sobrecarregados de tantos males estas crianças acabam aprendendo que não poderão aprender, buscando estratégias de sobrevivência neste sistema, tentam adequar-se às normas e copiam do quadro mesmo sem saber como e porquê. Outras se recusam a copiar, procuram outras atividades para fazer, surgindo o espaço ideal para a indisciplina.
Várias pesquisas afirmam que o fracasso na leitura constitui uma das principais causas de repetência ou atraso escolar. Cerca da metade dos alunos repetem a primeira série onde a repetência é acentuada e está intimamente relacionada com problemas no ensino e na aprendizagem inicial da leitura e escrita e, nos casos dos alunos provenientes de família de baixa renda, essa porcentagem sobe para 60% (TORRES, 1999, p. 12).
Segundo FERREIRO (1989, p. 73)
A escola geralmente, ineficiente para introduzir as crianças no mundo da língua escrita, é contudo, extremamente eficiente para conseguir fazer com que assumam a culpa de seu próprio fracasso: um dos maiores danos que se pode fazer a uma criança é leva-la a perder a confiança em sua capacidade de pensar.
Nesse contexto, o ensino da escrita tem se reduzido a uma simples técnica que serve e funciona num sistema de reprodução cultural. Os efeitos desse ensino são evidentes, não apenas nos índices de evasão e repetência, mas nos resultados de uma alfabetização sem sentido que produz uma atividade sem consciência, desvinculada da realidade e desprovida de sentido, tornando a escrita um instrumento seletivo, dominador e alienador.
Já é bem conhecido o fato de que o fracasso escolar não se distribui democraticamente no conjunto da população. O fracasso escolar inicial, que é o da alfabetização, se concentra nas populações urbanas e rurais marginalizadas. Constitui, também, lugar comum assinalar correlações positivas entre o fracasso da alfabetização no tempo escolar requerido e fatores como estado de saúde da criança (especialmente o nutricional) o nível de educação dos pais, as condições gerais de vida, etc. os professores e a instituição escolar têm aceitado, com facilidade, a realidade de tais fatos... (FERREIRO, 1989, p. 72).
2.3 CONCEPÇÃO SOBRE ALFABETIZAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DO SEU PROCESSO
Tradicionalmente, o processo de alfabetização estava diretamente relacionado com a inteligência (QI), essa visão da alfabetização dominou, durante muito tempo, os estudos e pesquisas na área, explicava o papel desempenhado pela ideologia do dom, na justificativa do fracasso em alfabetização, atribuindo a responsabilidade por esse fracasso às chamadas disfunções psiconeurológicas da aprendizagem da leitura e da escrita (afasia, dislexia, discalculia, disgrafia, disfunção cerebral mínima, ect).
Mais recentemente, o foco da análise da alfabetização voltou-se para as abordagens cognitivas, sobretudo da Psicologia Genética de Piaget. Embora Piaget não tenha realizado pesquisas sobre a aprendizagem da leitura e da escrita, vários pesquisadores têm estudado a alfabetização, entre esses, destaca-se Emília Ferreiro.
Mas apesar de todos os estudos realizados, ainda hoje a alfabetização tem sido considerada como processo de aquisição do código alfabético, em que a escrita representa a transcrição dos sons em fonemas.
Nessa concepção de alfabetização e do seu processo de desenvolvimento o aluno é considerado como aquele que não possui qualquer conhecimento, que deve estar pronto para receber as informações de como lidar com esse código, através de um professor que, detendo o conhecimento, restringe-se apenas a transmiti-lo. A escola considera-se guardiã do objeto cultural: a linguagem escrita, tomando-o como algo estático e imutável, como um modelo a ser seguido, que exige do educando uma atitude de respeito diante deste objeto e ainda cópia e reprodução fiel, sem direito a modificações.
Desta forma, a aquisição da leitura e da escrita deve acontecer através da utilização de um conjunto de procedimentos: métodos, técnicas e recursos, que possibilitem aos educandos adquirirem habilidades em relação ao uso desse código.
O trabalho do professor quanto à alfabetização tem-se centralizado na busca do melhor ou mais eficaz método levantando, assim, uma polêmica em torno dos métodos sintético e analítico.
Os métodos sintéticos começam pela apresentação de elementos considerados simples (elementos sem nenhuma significação) e, por composição, vão alcançando as unidades significativas. Os métodos analíticos partem das unidades com significado (palavras ou frases) que vão decompondo progressivamente até alcançarem as unidades menores. Frente a esta dicotomia, muitos professores declaram que utilizam um método misto que nada mais é, do que uma mistura de elementos recebidos, que estão na moda. Essa forma tradicional leva a escola ver na alfabetização uma vinculação entre os métodos utilizados e o estado de maturidade ou prontidão, de conceber a escrita como transcrição gráfica das unidades sonoras e a leitura como decodificação deste código, essa realidade mostra o total desconhecimento dos professores e do processo de alfabetização.
De acordo com MOURA (1999, p. 127):
Essas concepções e as formas de proceder baseada nos métodos, desnudado as práticas escolares que são de certo modo responsáveis pelo fracasso das crianças, pela sua expulsão da escola, transformando-as em analfabetos funcionais que, no futuro, em alguns casos, transforma-se nos adultos que voltam à escola em busca do conhecimento não adquirido.
Além da utilização dos métodos, o livro didático é apresentado para o aluno como uma fonte de conhecimentos do mundo, ao invés de ser um dos objetos de conhecimento. As atividades de leitura e escrita, baseadas no livro didático, são totalmente desprovidas de sentido e totalmente alheias ao funcionamento da língua.
Para MOURA (1999, p. 131):
À medida que o professor desconhece o processo de aquisição que constitui a alfabetização, as características dos sujeitos que aprendem, ele torna o processo mais difícil do que deveria ser, produzindo fracasso escolares desnecessários, transformando a experiência da alfabetização em uma experiência literalmente traumática.
Em contraposição a essa concepção em torno da alfabetização e a preocupação com os níveis alarmantes de fracasso escolar, Emília Ferreiro propõe a psicogênese da língua escrita, onde o processo de aquisição da escrita é construído pela criança, e os objetivos da alfabetização devem possibilitar aos educandos irem muito além do que adquirir habilidades para a leitura e a escrita, mas sim interpretar aquilo que se lê e escreve, o processo de aprendizagem é resultado da atividade do sujeito que compara, exclui, ordena e reformula.
Segundo MOURA (1999, p. 140):
A alfabetização consiste num processo pedagógico e epistemológico deve possibilitar, ao sujeito, a apropriação do sistema de representação da linguagem escrita e a sua conseqüente reconstrução e utilização para si como objeto possibilitador da apropriação de novos conhecimentos e de intervenção em diferentes situações sociais.
De acordo SMOLKA (1988, p. 47), Emília Ferreiro deixa bem claro a sua concepção sobre o sistema de linguagem em contraposição à concepção tradicional e faz a distinção entre a escrita como sistema de representação da linguagem e a escrita como sistema de decodificação.
No primeiro caso, a escrita é concebida como um código de transcrição e a aprendizagem é concebida como aquisição de uma técnica. Tem-se uma imagem pobre do sujeito que aprende, não se entende nem se considera as experiências que ele tem e muito menos as suas concepções sobre a escrita, nem se avalia o seu caminho evolutivo até chegar à produção da escrita.
No segundo caso, a escrita é entendida como um sistema de representação e a aprendizagem se converte na apropriação de um novo objeto de conhecimento. Entende-se que o processo de evolução do sujeito em direção à apropriação da escrita é um processo complexo que se identifica com a própria história da construção da escrita pela humanidade
Desta forma, esta concepção de alfabetização pressupõe ter bem clara a distinção entre apropriação de conhecimento de aprendizagem e uma técnica de decodificação, pois a alfabetização é um processo ativo de reconstrução por parte do aluno que não pode se apropriar verdadeiramente de um conhecimento se não quando compreendeu seu processo de construção.
Essas mudanças requerem novas atitudes em relação à compreensão dos sujeitos e do objeto da alfabetização. Requer entender que a escrita não é um produto escolar, mas sim objeto cultural, resultado do esforço coletivo da humanidade e que não é pela utilização de técnicas, métodos que o sujeito produz a escrita. O processo de alfabetização, enquanto construção do conhecimento, é uma tarefa crucial tanto para as crianças quanto para os professores.

3. METODOLOGIA
Com o intuito de refletir sobre o papel da psicopedagogia preventiva no fracasso escolar na alfabetização, este trabalho optou-se, num primeiro momento pela pesquisa bibliográfica para construção de um referencial teórico.
De acordo com LAKATOS & MARCONI, (1995, p. 43), "a pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras".
Num segundo momento, tornou-se necessário fazer uma confirmação entre o referencial teórico construído e a realidade escolar, para isso, foi realizada uma pesquisa de campo do tipo descritiva exploratória.
Segundo BASTOS & KELLER:
A pesquisa de campo visa suprimir dúvidas, ou obter informações e conhecimentos a respeito de problemas para as quais se procura resposta ou a busca de confirmação para hipóteses levantadas e, finalmente, a descoberta de relações entre fenômenos ou os próprios fatos novos e suas respectivas explicações (1992, p. 55).
Como instrumento de pesquisa foi utilizado um questionário que constou de perguntas abertas e fechadas, aplicadas sob forma de entrevista pessoal, que foi coletada junto aos professores, com o propósito de refletir sobre o papel da psicopedagogia preventiva no fracasso escolar na alfabetização.
Conforme MARCONI & LAKATOS:
Como técnica de coleta de dados, a entrevista oferece várias vantagens: oferece maior oportunidade para avaliar atitudes,, condutas, podendo o entrevistado ser observado naquilo que diz e como diz: registro de reações, dá oportunidade para obtenção de dados que não se encontram em fontes documentais e que sejam relevantes e significativos... (1990, p. 86).
O universo deste estudo foi representado por 08 professores que atuam na 1ª série do Ensino Fundamental de escolas da rede pública estadual e privada de Santa Maria-RS, e ainda na Escola de Aplicação São Vicente de Paulo, pelo fato de a mesma ser uma extensão do Centro Universitário Franciscano onde, futuramente, acontecerão todas as atividades de prática de ensino dos cursos de licenciatura da Instituição.
4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A seguir serão discutidos os resultados obtidos das entrevistas realizadas com 08 professores alfabetizadores de escolas particular e pública.
4.1 CARACTERIZAÇÃO DA CLIENTELA
Os professores entrevistados na sua maioria possuem formação superior, com tempo de atuação no magistério entre cinco a quinze anos. Em relação ao tempo de atuação, em alfabetização, a grande maioria dos professores possuem cinco a quinze anos. A média de alunos por turma é de vinte a vinte e cinco por classe, com idade média de sete anos de idade.
 TABELA 01 - Questões propostas e as opiniões do entrevistados
Questões


Sim
Não
Total
Dificuldades para aprender a
7
1
8
ler e escrever
Foram muitos casos de
7
1
8
dificuldades na aprendizagem
Alunos reprovados
7
1
8
No que se refere às dificuldades para aprender a ler e escrever, percebe-se que a grande maioria dos professores entrevistados se deparam com essa situação, acarretando com isso na reprovação dos alunos que apresentam tal dificuldade.
Conforme DORNELES (1990, p. 251), à medida que começamos a estudar mais profundamente o fracasso escolar, percebemos que, no Brasil, esse problema adquire características de fenômeno de massa, ou seja, atinge a maior parte da população em idade escolar.
GRÁFICO 01 – Áreas em que as dificuldades de aprendizagem da leitura-escrita estão mais relacionadas:
http://www.psicopedagogia.com.br/images/Image1.gif
Os dados acima revelam que, em relação às áreas em que as dificuldades de aprendizagem estão mais relacionadas, destacam-se as áreas: cognitiva 30%, afetiva 30%, social 30%, ficando a área física em menor ocorrência, apenas 10%.
Segundo WEISS (2000, p. 16), os aspectos cognitivos estão ligados basicamente ao desenvolvimento e funcionamento das estruturas cognoscitivas em seus diferentes domínios. Inclui-se nessa grande área aspectos ligados à memória, atenção, antecipação. O fracasso escolar está ligado ao aluno enquanto aprendente, isto é, especificamente às condições internas de aprendizagem.
Com relação à área afetiva a autora, ressalta a ligação entre o desenvolvimento afetivo, e sua relação com a construção do conhecimento e a expressão deste através da produção escolar. O não-aprender pode, por exemplo, expressar uma dificuldade na relação da criança com a sua família, será o sintoma de que algo vai mal nessa dinâmica.
Quanto à área social, WEISS afirma que no diagnóstico psicopedagógico do fracasso escolar de um aluno não se pode desconsiderar as relações significativas existentes entre a produção escolar e as reais oportunidades que a sociedade possibilita aos representantes das diversas classes sociais.
Em relação à área física, constata-se que os professores entrevistados não consideram como a área que esteja mais relacionada com as dificuldades de aprendizagem, pelo fato de que em suas classes não havia crianças portadoras de necessidades especiais ou com déficit físico ou orgânico, mas reconhecem a importância do corpo na aprendizagem.
Conforme PAIN (1985, p. 22), é com o corpo que se fala, se escreve, se tece, se dança, resumindo, é com o corpo que se aprende. As condições do mesmo sejam constitucionais, herdadas ou adquiridas, favorecem ou atrasam os processo cognitivos e, em especial, os da aprendizagem.
QUADRO 01 - A quem atribui as dificuldades de aprendizagem?
A quem atribui as dificuldades de aprendizagem?
Ausência da família
7
Mídia
4
Condição social
1
Pobreza
1
Falta de interesse
1
No quadro acima, verifica-se que a maioria dos professores entrevistados consideram a ausência da família como um fator que contribui para as dificuldades de aprendizagem durante a alfabetização.
De acordo com SCOZ (1994, p. 71), a influência familiar é decisiva na aprendizagem dos alunos. Os filhos de pais extremamente ausentes vivenciam sentimentos de desvalorização e carência afetiva, gerando desconfiança, insegurança, improdutividade e desinteresse, sérios obstáculos à aprendizagem escolar.
A influência da mídia aparece como o segundo fator que contribui para as dificuldades de aprendizagem, pois conforme LIBÂNEO (2000, p. 72), a televisão passa a ser um instrumento cada vez mais poderosos no processo de socialização. Um dos aspectos negativos dessa influência é a tendência à passividade e à dependência das crianças prejudicando o desenvolvimento pleno de suas capacidades cognitivas e sócio-afetivas.
Os professores consideram que a pobreza e a condição social dos alunos como um fator que influencia nas dificuldades de aprendizagem. Para SCOZ (1994, p. 81), a pobreza dos alunos aparece com forte determinante dos problemas de aprendizagem. A autora ressalta que sem querer negar que grande parte do fracasso de alguns alunos pode estar relacionado à pobreza material a que estão submetidos, é importante estar atento para que a baixa renda das famílias não seja utilizada como justificativa para o insucesso escolar das crianças, eximindo a escola de qualquer responsabilidade.
Alguns professores apontaram a falta de interesse do aluno como um fator que contribui para as dificuldades de aprendizagem.
Mas, para WEISS (2000, p. 23), é preciso que o professor competente e valorizado encontre o prazer de ensinar para que possibilite o nascimento do prazer de aprender. O ato de ensinar fica sempre comprometido com a construção do ato de aprender, faz parte de suas condições externas. A má qualidade do ensino provoca um desestímulo, na busca do conhecimento. Não há assim um investimento dos alunos, do ponto de vista emocional, na aprendizagem escolar, e essa seria uma condição interna básica. Casos há em que tal desinteresse é visto como um problema apenas do aluno, sendo ele encaminhado para diagnóstico psicopedagógico por não ter o menor interesse nas aulas é não estudar em casa, baixando assim sua produção.
TABELA 02 - A quem recorre quando surgem as dificuldades de aprendizagem?
Recorre ao(à)

n.º

%
Família
9
29
Psicopedagogo
7
23
Fonoaudiólogo
5
16
Orientador Educacional
5
16
Psicólogo
5
16
TOTAL


31

100
No que refere a quem o professore recorre quando surgem as dificuldades de aprendizagem, 39% dos professores entrevistados recorrem aos pais. Ao mesmo tempo que a ausência da família é considerada com um dos fatores que contribuem para as dificuldades de aprendizagem, os professores, como mostra a tabela acima, procuram a família para ajuda-los.
Constata-se que mesmo a família estando ciente das dificuldades que apresenta a criança, muitas vezes, fica omissa não ajudando o professor, não contribuindo para o trabalho da escola, que deveria ser em conjunto com a família para superação das dificuldades.
De acordo com SCOZ (1994, p. 143), o contato com a família pode trazer informações sobre fatores que interferem na aprendizagem e apontar os caminhos mais adequados para ajudar a criança. Também torna possível orientar aos pais para que compreendam a enorme influência das relações familiares no desenvolvimento dos filhos.
TABELA 03 - Concepção de alfabetização
Concepção

n.º

%
Ir além de ler e escrever
5
42
Prazerosa
3
25
Desafiadora
2
17
Significativa
1
8
Criativa
1
8
TOTAL


12

100
Quanto à concepção de alfabetização dos professores, percebe-se que esse processo deve ser prazerosos, desafiador e, principalmente deve possuir significado, que permita ao aluno ir além de escrever e ler, isto é, que seja uma construção resultante da interação da criança com a língua escrita.
Conforme WEISS (2000, p. 70), alfabetizar é penetrar num mundo novo, é mudar o eixo referencial da vida. O domínio da língua escrita dá à criança uma autonomia ao mesmotempo prazerosa e assustadora.
QUADRO 02 – Métodos de alfabetização utilizados
Método de alfabetização
Método de alfabetização proposto
Sim: método construtivista
Escola: nenhum professor utiliza
método construtivista
um método proposto pela escola
sócio-interacionista
Pessoal: todos os professores
método silábico-alfabético
possuem um método pessoal ou em
Não: 5
construção comunitária com os



demais professores

No que se refere ao método de alfabetização proposto pela escola, todos os professores entrevistados foram unânimes em dizer que a escola não apresenta um método de alfabetização, todos os professores utilizam um método pessoal de alfabetização ou em construção comunitária com os demais professores.
Apenas três professores entrevistados disseram possuir um método de alfabetização específico, os demais não utilizam um método específico. Os métodos de alfabetização utilizados são: o método construtivista, método sócio-interacionista e o método silábico-alfabético, mas através da entrevista foi possível constar que os professores que disseram utilizar os métodos citados acima possuem pouco esclarecimento sobre a teoria que os fundamentam.
Com relação às alternativas didáticas, FERREIRO (1989, p. 73), afirma que, muitos professores declaram utilizar um método misto, que nada mais é, em realidade, do que uma mistura de elementos recebidos, por tradição de outros que estão na moda e de uma certa dose de intuição.
4. CONCLUSÃO
Após a construção do referencial teórico e análise das respostas dos professores, que responderam aos questionamento, considera que:
O fracasso escolar na alfabetização, ainda hoje, faz parte do cotidiano das nossas escolas, acarretando na grande maioria das vezes na reprovação.
Essa constatação reforça a importância do psicopedagogo institucional no sentido de criar condições juntamente com os professores para que a aprendizagem da leitura e da escrita aconteça de maneira eficaz, prazerosa e significativa. Atuando, como assessor, na busca da melhoria do processo de aprendizagem, desenvolvendo um trabalho integrado professor-psicopedagogo-escola no sentido de melhor desenvolver a prática educativa. Isto significa que o professor precisa entender como acontece a aprendizagem da leitura e da escrita, buscando as origens das dificuldades, do fracasso, avaliar, diagnosticar e, acima de tudo, estabelecer um rumo teórico de ação.
É portanto, através da intervenção psicopedagógica dirigida aos professores que se acredita no real progresso da aprendizagem voltada sobretudo, a uma educação integrada ao desenvolvimento do aluno como agente produtor do seu meio e não apenas como um resultado.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BASTOS, Cleverson Leite; KELLER, Vicente. 1992. 3. ed. Aprendendo a aprender: introdução à metodologia científica. Petrópolis: Vozes.
____________________________________________________________
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 Monografia do Curso de Especialização em Psicopedagogia do Centro Universitário Franciscano

BOSSA, Nádia Aparecida. 1994. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Porto Alegre: Artes Médicas.

DORNELES, Beatriz Vargas. 1990. Mecanismos seletivos da escola pública: um estudo etnográfico. In: SCOZ, Beatriz Judith Lima; RUBINSTEIN, Edith; ROSSA, Eunice M. M. et al. 1990. Psicopedagogia: o caráter interdisciplinar na formação e atuação profissional. Porto Alegre: Artes Médicas.

FERNÁNDEZ, Alícia. 1990. A Inteligência Aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas.

FERREIRO, Emília. 1989. Alternativas para a compreensão do analfabetismo na região. Revista Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 14, n. 21, p. 70-80, jan/jun.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. 1992.Metodologia do trabalho científico: procedimentos básicos, pesquisa bibliográfica, projeto e relatório, publicações e trabalhos científicos. 4. ed. São Paulo: Atlas.

LIBÂNEO, José Carlos. 2000. Adeus professor, adeus professora?: novas exigências educacionais e profissão docente. 4. ed. São Paulo Cortez.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. 1990. Técnicas de pesquisa: planejamento execução de pesquisas, amostragens e técnicas de pesquisa, elaboração, análise e interpretação de dados. 2. ed. São Paulo: Atlas.

MOURA, Tânia Maria de Melo. 1999. A prática pedagógica dos alfabetizadores de jovens e adultos: contribuições de Freire, Ferreiro, Vygotsky. Maceió: EDUFAL.
PAIN, Sara. 1985. Diagnóstico e tratamento dos problemas de aprendizagem. 4 ed.. Porto Alegre: Artes Médicas.

SCOZ, Beatriz Judith Lima. 1994. Psicopedagogia e realidade escolar: o problema escolar de aprendizagem. Petrópolis: Vozes.

SMOLKA, Ana Luiza. 1988. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização com processo discursivo. São Paulo: Cortez.

TORRES, Rosa Maria. Repetência escolar: falha do aluno ou falha do sistema. Revista Pedagógica Pátio, POA, 1999, ano 3, n. 11, p. 9-11, nov/jan.

WEISS, Maria Lúcia L. 2000. Psicopedagogia Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem. 7. ed. Rio de Janeiro: DP&A.

 






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